Não sei onde vi este título, mas gostei e vou roubar para esta coluna que trata de várias coisas. A primeira delas é um pedido feito por um leitor para comentar o Dakar 2005 e falar sobre o Jean Azevedo. Primeiro deixa eu explicar uma coisa que não ficou bem clara na última coluna (“Estou com raiva do Dakar”).
Minha raiva é natural pela perda de uma pessoa nobre como Fabrizio Meoni. Se ele tivesse morrido picado por uma abelha eu teria raiva de todas as abelhas do mundo. Se ele tivesse morrido engasgado com uma ervilha eu ficaria com raiva de ervilhas e provavelmente nunca mais comeria uma daquelas bolinhas verdes. Esta raiva é natural e acho que muitas avós ficaram com raiva da Fórmula 1 depois do dia 1º de maio de 1994 quando o neto mais querido se espatifou na Tamburello. É natural, seria esquisito se eu disesse que amo o Dakar e tudo aquilo que ele representa.
O Jean Azevedo é o irmão mais novo do André Azevedo. Este, mais o Klever Kolberg, foram os primeiros brasileiros a apostar os colhões em cima de duas motos no ainda chamado Rali Paris-Dakar. Acho que foi em 1988 que a dupla vestiu as roupas, colocou as peças reservas em uma pesada mochila e se meteu no maior desafio motorizado da época. Muitos invejosos de plantão comentavam que Klever era melhor marketeiro do que piloto – mais ou menos o que diziam de André Ribeiro – só que tiveram de calar as bocas e enfiar a inveja no saco porque a mesma dupla está até hoje nesta prova, os dois se profissionalizarm, conseguiram posições de destaque e deram a luz a este geniozinho chamado Jean Azevedo.
Uma das coisas mais difíceis do mundo é entrevistar o Jean. O cara é tímido, quasemonossilábico e suas respostas raramente vão além do “sim”, “é”, “não” e coisa parecida. Durante as entrevistas coletivas ele acaba falando mais, porque certamente o “marketeiro” Klever Kolberg faz uma preleção e mostra que falar em público não é assim tão dolorido ou angustiante.
O que importa é que Jean Azevedo é o melhor piloto de rali de moto do Brasil e ponto final. O cara acelera, economiza a moto, sabe navegar e teve como mérito a façanha de se tornar o primeiro brasileiro a vencer uma etapa do Dakar em cima de uma moto. Já vi o Jean pilotando e podem acreditar: no dia em que ele for contratado para correr por uma equipe de fábrica vai despontar como um favorito fácil.
Em 2005 as KTM dominaram porque as outras fábricas tiraram os times de campo. Honda, Cagiva e BMW saíram fora depois de alguns títulos. A Yamaha manteve um esquema semi-oficial para desenvolver o projeto do modelo 450 com tração nas duas rodas. A idéia foi muito bem sucedida e podem apostar que esta tecnologia brevemente vai chegar nas KTM. O sistema é simples, funciona por bomba hidráulica e envia um máximo de 20% de potência para a roda dianteira por meio de mangueiras. É o suficiente para a frente não afundar nos areiões e para a moto não atolar. Para avaliar a eficiência do sistema, em trechos de dunas a 450 de um cilindro da Yamaha foi mais rápida do que as 900 bicilíndricas da KTM.
Entre os carros, Stephane Peterhansel conseguiu vencer pela segunda vez e podem ter certeza que vai continuar vencendo. Ele já tinha sido seis vezes vencedor do Dakar com as motos e agora chegou à segunda vitória com a Nissan. É um mágico. Depois da morte do Meoni, Peterhansel deu uma entrevista ao correspondente brasileiro justificando sua passagem das motos para os carros e disse claramente que mudou porque “estava com medo de um acidente”. Isso mesmo, o maior campeão do Dakar admitiu publicamente que teve medo e isso não o envergonha nem desmerece o cara. Entrevistei o Peterhansel quando ele correu o Enduro da Independência em Belo Horizonte e fiquei impressionado quando ele disse que o seu maior ídolo era Ayrton Senna e que se espelhava no brasileiro para nortear a carreira. Acho que isso foi em 1992 ou 1993.
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Corta para o Mundial de MotoGP. Nos primeiros testes Alexandre Barros já deu um recado: vai incomodar! Fez dois treinos excelentes e acabou atrás apenas da Ducati de Loris Capirossi e da Yamaha do Valentino Rossi. Quem ligou a TV agora e não está entendendo nada, vai um lembrete: Alexandre saiu (ou foi saído) da Honda fábrica e agora está de volta à equipe Pons e vai correr de Honda oficial. Segundo ele mesmo disse, “testamos perto de 12 tipos de pneus Michelin e começamos a mexer na moto”.
Traduzindo: Barros vai chegar na primeira etapa com um belo feeling dos pneus e com a moto da fábrica já acertada. Pausa para explicar: acho que em 2004 Alexandre tomou na tarraqueta porque os engenheiros da HRC – o reparto corsa da Honda – não davam muito ouvido aos reclamos do brasileiro. Em uma equipe menor, a palavra do piloto é soberana e a liberdade para fazer mudanças também.
Mas não vou ficar aqui justificando a fraca temporada do Barros em 2004. Até agora ele está bem perto do Valentino, apenas 1 décimo de segundo. No ano passado ele ficava a oito décimos de segundo nos treinos e a meio segundo nas corridas. Vamos ver o que pode rolar em fevereiro, quando as equipes fazem outro treino oficial, ainda sem a Honda-fábrica junto. O pau vai comer feio em 2005 e quem não tiver acesso à SporTV vai perder uma temporada das mais emocionantes. Enquanto Shummy promete fazer da F1 2005 outro desfile em vermelho, na MotoGP vai voar pena pra tudo que é lado.
A partir da próxima coluna já podem esperar por notícias mais quentes.
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Outro assunto: Jacarepaguá!
Minha Gente! (essa eu roubei do Collor). Não se iluda. Estamos no Brasil, que está mais próximo da África do que da Europa. Sabe aquela viagem a remo que Amyr Klink fez da África até o Brasil? Imagine se ele viesse da Inglaterra? Estaria até hoje remando em algum ponto do Atlântico.
Não sonhe com um país no qual o automobilismo e o motociclismo serão tratados com prioridade. E sem apelos saudosistas quanto ás glórias do passado. Em um país onde tiveram coragem de demolir monumentos históricos, represar áreas de beleza natural incomparável e outras pataquadas, quem vai se importar com uma pista de corrida?
O circuito de Jacarepaguá é sub-usado, mal conservado e cheio de bumps. As corridas nacionais são assistidas por uma merreca de público. Se faz sol a praia é muito melhor. Se chove – e chove pra caramba naquele aterro – ninguém vai se deslocar até lá. Então, só serve para alguns pilotos se divertirem. Meu colega da revista Racing foi cobrir uma etapa do Campeonato Carioca de Automobilismo e viu uma largada com 2 (DOIS) carros!!!
Eu procurei a administração do circuito para levar minha escola de pilotagem esportiva de motos (SpeedMaster) para lá. Cobraram um valor indecente e imoral pelo aluguel da pista para um final de semana. Mudei a escola para Caruaru (Pernambuco) onde a realidade é bem diferente e os preços são normais.
Não adianta cortar a pista. Ou mantém o traçado ou arranca tudo de uma vez. Se a pista ficar com 2.700 metros, servirá apenas para escolas de pilotagem (êba!), mas terão de rever os valores de aluguel. Imagine uma corrida de Stock-Cars em uma pista de 2.700 metros! Vai dar tontura!
Está na hora de privatizar os autódromos e acabar com a mamata de muito funcionário público. No interior de São Paulo, de Minas Gerais e do Rio de Janeiro existem muitas áreas que poderiam abrigar autódromos modernos, com boas áreas de acesso e sem interferência de políticos ineptos e aproveitadores. Eu já pilotei em dois autódromos particulares, um do Dimas de Melo Pimenta e outro dos Diniz. Se dois empresários cheios da grana podem construir autódromos só para brincar de carrinho, por que empresas grandes não podem construir um autódromo de verdade? É preciso tirar dinheiro das ações sociais prioritárias para investir em modalidades para ricos?
Minha gente, chega de mamar na teta do Estado. O que já se gastou em reformas em Interlagos a cada corrida de F1 daria para fazer 10 autódromos de nível internacional. E querem saber? Para motos Interlagos é uma merda! Perigoso, com muros muito próximos da pista e cheio de lombadas. Sou favorável a demolir Interlagos e Jacarepaguá, privatizar as pistas e construir circuitos melhores e mais seguros.
Geraldo Tite Simões |