Vladimir Ilich Ulianov, popularmente conhecido como Lenin, acho que não precisa de nenhuma apresentação, pois todos sabemos quem era e o que era. Em certa ocasião Lenin disse que “Uma mentira repetida constantemente passa a ser verdade!“, e convencido do que dizia, Lenin se lançou com afinco a pôr em prática tal afirmação entre as massas.
Alguns anos depois, outro seguidor de Marx, o alemão Joseph Goebbels repetiria a frase de Lenin e, com o mesmo entusiasmo do russo, se dedicaria com fervor à tarefa de repetir mentiras para que terminassem sendo assumidas como verdades pelo povo. O caso é que milhões de pessoas se deixaram enganar por ambos, vitimas de tão persuasivo e insidioso sistema.
A FIA, desde os tempos do inefável Max Mosley, vem insistindo na necessidade de impor às equipes um limite nos seus orçamentos e, com motivo da retirada da competição das equipes da Honda e da Toyota (também da BMW, ainda que no seu caso isso não resultava tão surpreendente, devido ao seu menor tamanho e potencial econômico) em 2008, Mosley usaria isso para justificar sua afirmação de que a formula um estava resultando demasiado cara e que por isso estas equipes se haviam retirado do campeonato.
Particularmente penso que o motivo da retiradas dessas equipes não foi o fato dos custos por participar serem demasiado altos. Creio que o verdadeiro motivo foi que os custos eram demasiado altos… para os pobres resultados que conseguiam. O francês Jean Todt, sucessor de Mosley na presidência da FIA, parece haver assumido a mesma grandiloquente verborragia tendente a impor a tão reverenciada redução de custos. Pelo menos isso transparece das palavras que ele vai soltando ao vento. Com frequência vem dizendo Todt que “a formula 1 esta muito cara“, que os custos devem ser reduzidos “para ajudar as equipes pequenas“.
No entanto, quando Todt comandava a Ferrari, a equipe com o maior orçamento da categoria, eu não lembro que ele se queixasse por dispor de tanto dinheiro, nem de tê-lo ouvido nunca dizer nada em favor das outras equipes. Quem te viu, e quem te vê! Segundo as palavras de outro popular marxista – Mao Tse Tung – “a verdade há de se buscar nos fatos“. Pois bem, os fatos não parecem ter muita relação com o que se diz, e bastam alguns exemplos para constatar essa discordância, sendo o caso dos pneus muito ilustrativo disso. A implantação de um único fornecedor foi apresentada como uma panaceia que reduziria os custos para as equipes, mas eu não lembro que seus orçamentos baixassem por isso, pois o dinheiro que, supostamente, poupavam com o fornecedor único, simplesmente era transferido para outra área de desenvolvimento e, assim, a ilusória poupança nunca chegou.
Muito ao contrário, os orçamentos continuaram subindo. Inclusive na web da FIA se continua argumentando que com um único fornecedor, além de reduzir custos, a competição se nivela. O que não dizem lá é que, se essa igualdade não convém a algumas equipes, se modificam as características do pneu, como aconteceu este ano no meio do campeonato, ainda que isso viole o seu próprio regulamento. É certo que nestes últimos anos, em plena crise econômica, as despesas, em geral, baixaram, mas foi uma baixada imposta pela falta de recursos disponíveis no mercado. No entanto, essa baixada ocorreu mais nas despesas “supérfluas”, como por exemplo os suntuosos motor-home que as equipes construíam (o da McLaren custou mais de 30 milhões de euros!), não como consequência das medidas da FIA.
Jean Todt aproveitou essa conjuntura para insistir que os custos devem baixar ainda mais – cerca de 30% – caso contrário algumas equipes podem desparecer. Porém, como recentemente disse o engenheiro Gary Anderson, as coisas não eram muito diferente no passado, e as equipes sempre tinham que andar buscando dinheiro como fosse e onde fosse, para poder subsistir. Inclusive durante a terrível crise econômica dos anos 70s, com motivo da enorme subida do preço do petróleo, algumas escuderias despareceram (BRM ou Surtees, e Brabham foi salva no último momento pelo tio Bernie), mas outras surgiram (Renault ou Arrows, e Williams se consolidou). Colin Chapman disse que “participar na Fórmula Um custa tanto quanto você puder pagar!“. Sempre foi assim!
O que resulta chocante dessa suposta preocupação por baixar os custos é o resultado que as medidas implementadas pela FIA nesse sentido acabam tendo na prática. Outra dessas “essenciais” medidas anunciada para reduzir custos, foi a limitação dos testes que as equipes faziam para desenvolver seus carros. O resultado imediato, para compensar essa falta de testes nas pistas, foi um aumento nos fundos investidos pelas equipes em sofisticados simuladores.
Agora, a FIA já anunciou que os testes durante a temporada voltarão a ser permitidos a partir de 2014. Assim, eu não acho que as equipes prescindam de seus custosos simuladores, portanto teremos as equipes gastando dinheiro em casa… e nas pistas! Poupança? O mesmo pode ser dito dos motores e das caixas de câmbio, cuja exigência de mais durabilidade levou os fabricantes a investir pesado para conseguir uma maior fiabilidade. Quando esses custos extras estavam começando a se amortizar, a FIA muda o regulamento e decreta o retorno dos motores turbo e mais sofisticados KERS. A Mercedes, por exemplo, foi publicado que triplicou seu orçamento para o departamento de motores, passando de 17 milhões de libras a 52 milhões. A consequência lógica disso é que as equipes pequenas terão de pagar mais pelos motores a seus fornecedores. Poupança?
Falando do KERS, quando estes foram exigidos pela FIA, Max Mosley disse então que era favorável aos modelos mecânicos pois, segundo ele, as baterias químicas (pouco respeitosas com o meio ambiente) dos modelos elétricos deviam ser proibidas na Fórmula um. Foram? É, me parece que as mentiras da FIA saem logo à tona. Podíamos também falar sobre as “reverenciadas” tecnologias verdes ou energias limpas, mas o caso é que o circo da formula não tem nenhum escrúpulo em se deslocar de uma parte a outra do mundo, a custo de grande consumo de energia nada limpa, atendendo assim à irresistível chamada dos bons milhões que pagam diferentes ditadores ou políticos corruptos por ter “seu GP” (China ou Barhein e Valencia ou India). A única energia que não contamina é aquela que não se consome!
E que dizer da também reverenciada sustentabilidade, tão bem representada por uns pneus que se desintegram em apenas umas poucas voltas, o que leva à produção de milhares de pneus numa temporada, e a consequente emissão de gases nada “verdes” no processo. Os fabricantes se esforçam em desenvolver pneus mais duradouros para nossos carros, e a FIA obriga a Pirelli a construir ridículos pneus que se esfarelam rapidamente só para gerar emoção… Artificialmente!
Porém, esta temporada, a FIA acaba de se superar a si mesma com uma medida que é o cúmulo da contradição: aumentou o preço da taxa de inscrição que as equipes devem pagar por participar no campeonato. Desde os tempos de Mosley, este foi um almejo da FIA e, justamente, quando mais se insiste na redução de custos… Eles impõem às equipes outro aumento em suas despesas. Poupança? Neste assunto das taxas, o caso parece até perverso. Resulta que, segundo o novo pacto da concórdia entre a FOM (tio Bernie) e as equipes, parece que houve um acordo pelo qual, não apenas a Ferrari, mas também Red Bull e McLaren irão receber mais dinheiro que o resto das equipes. Um dos motivos esgrimidos pela FIA para a subida da tal taxa, foi que as equipes mais bem sucedidas (portanto com mais pontos) deviam contribuir mais.
Porém, me parece que a verdade é que, ao saber que as equipes iriam cobrar mais… a FIA também quis uma parte do botim, e a única forma de dissimular sua cobiça foi vincular a subida aos pontos conseguidos, esquecendo-se por completo das equipes que conseguem poucos ou nenhum ponto. Para um simples observador como eu, essa subida constitui até um abuso da FIA pois, incapazes de convencer Ecclestone para que lhes desse mais dinheiro (sabem que ele é um osso muito duro de roer), se aproveitam da “indefensabilidade” das equipes e, sem pudor, lhes enfiam a mão nos seus bolsos.
Poupança? Assim, de uma taxa de inscrição de 309.000 euros se passou a outra de 389,525 euros, além de que também se devem pagar 3.895 euros adicionais por cada ponto conseguido no campeonato de construtores. Portanto, as pequenas equipes que não conseguem nenhum ponto, essas às que a FIA tanto diz querer ajudar, devem pagar + 28% por participar, enquanto que as equipes que consigam pontos… ainda são mais “castigadas”. Ainda bem que não disseram que era para ajudá-las a gastar menos!
Perante tanta incoerência, pode haver alguém que ainda se deixe enganar pelas palavras da FIA? Lenin também disse que “a verdade é muito teimosa e, no fim, sempre se acaba impondo“. Os fatos e acontecimentos posteriores se encarregaram de confirmar que essa afirmação foi certa então, e tudo indica que continua sendo certa hoje.
Um abraço a todos e um bom fim de ano.
4 Comments
Manuel,
nem sei o que dizer depois de tudo que você escreveu acima .
Demagogia virou palavra chave na Formula 1.
Cadê os balancetes da FIA?
Pelo visto ela deve estar no vermelho ou será outra mentira? … hehehehe
Fernando Marques
Niterói RJ
Belíssimo texto Manuel, Belíssimo!!!
E já faz tempo que os que comandam só estão avacalhando com a F1.
Outro absurdo que você não mencionou é este das equipes term que manter o mesmo acerto nos carros durante toda a temporada.
Pode algo assim?
É muita coisa ruim que estão fazendo com a F1 já faz tempo.
E já faz tempo que eu me faço a mesma pergunta:
“Por que eu ainda acompanho a F1?”
Abraço!
Mauro Santana
Curitiba-PR
Querido Mauro,
Como resposta à sua pergunta “por que eu ainda acompanho a F1 ?, no meu caso posso dizer que ainda a acompanho, en grande medida, graças ao GPtotal e à boa gente que conheci aqui. Quando encontrei o GPtotal, meu interesse pela F1 éra já escasso e creio que, nao fosse o GPtotal, eu faz tempo que tería deixado a F1 num segundo ou terceiro plano.
um abraço, Manuel
Querido Manuel,
Texto excelente. Foi, sem dúvida, a maior “pedrada” que li sobre a FIA de Todt desde que este assumiu a presidência da FIA no lugar do abjeto Mosley, um homem que iniciou o caos esportivo do qual a Fórmula 1 ainda não se livrou. O discurso enganoso, e as falácias continuam intensas e sem possibilidade de mudança.
Sobre Todt, ainda há o agravante das edições da F1 no ditatorial Bahrein, sobre o qual já escrevi anos atrás. Capítulos vergonhosos.
Abração!
Lucas Giavoni