The Lotus years

Chegando lá
27/04/2015
A batalha do século
29/04/2015

A chegada de Senna à Lotus aconteceu em momento propício para o piloto. Mas era um casamento que não poderia durar muito.

Senna na Lotus

Apesar da fama, a equipe Lotus estava em um período de vacas magras no início dos anos 80, anotando uma única vitória entre as temporadas de 79 e 84. A morte do fundador Colin Chapman em 82 não ajudou, e Peter Warr assumiu a equipe em situação nebulosa. No entanto, a chegada de Gérard Ducarouge para a temporada 83 juntamente com os motores Renault Turbo permitiram à Lotus trilhar um novo caminho. Após a dispensa de Mansell no final de 1984, Ayrton Senna parecia a aposta perfeita para 85: um piloto jovem e ambicioso, para uma equipe em busca da glória de outros tempos.

No entanto, a relação entre Senna e Warr não começou da melhor forma possível. Logo após a assinatura do contrato para 85, às vésperas do GP da Holanda de 84, as partes envolvidas combinaram um pacto de silêncio, para que o anúncio fosse feito em um momento oportuno. Mesmo assim, a informação vazou no paddock, gerando a revolta da cúpula da Toleman que objetivava angariar novos patrocínios naquele fim de semana.

Para Senna, a transferência para a Lotus trazia duas fortes cobranças: repetir os bons resultados conquistados pelo compatriota Emerson Fittipaldi pela mesma equipe, bem como se mostrar digno de pilotar o cockpit ocupado por tantos mestres do automobilismo como Clark, Hill, Peterson e Andretti

A estréia de Senna na Lotus, no GP do Brasil, não saiu como o desejado. Nos treinos classificatórios o brasileiro saiu com uma interessante 4ª posição, com o companheiro de equipe Elio de Angelis em 3º. Na corrida, Senna chegou a andar boa parte da prova em 2º, porém teve problemas elétricos no carro que o forçaram a abandonar na 48ª de 61 voltas. A corrida seguinte, em Portugal, haveria de ser diferente.

Após conquistar sua primeira pole position no sábado, um verdadeiro dilúvio assolou o autódromo do Estoril na tarde de domingo. Uma chuva tão forte que vários pilotos saíram da pista ainda na volta de apresentação. Na largada, Senna manteve a ponta, enquanto Elio de Angelis assumia o segundo posto. A partir daí, Senna pilotou de maneira assombrosa, dando uma volta até no terceiro colocado, e abrindo mais de 1 minuto de vantagem para Alboreto, o segundo.

Apesar do domínio aparente, dentro do cockpit Senna não encontrou moleza: segundo o piloto, as condições de prova eram muito piores do que as encontradas em Mônaco no ano anterior, e Peter Warr chegou a discutir com os comissários solicitando o fim antecipado da prova. A primeira vitória do brasileiro não poderia ser mais emblemática: pole position, volta mais rápida e pilotagem magnífica na chuva.

Porém, o que parecia um início promissor foi seguido por um longo período de problemas. Apesar de conquistar poles em três das sete corridas seguintes, nenhuma delas se materializou em vitória. Pior, foram sete abandonos seguidos, a maioria deles por pane seca ou outro tipo de falha no equipamento.

A maré só mudou a partir do GP da Áustria, a partir do qual Senna obteve 5 pódios seguidos, duas poles (uma delas em Brands Hatch, já relatada neste espaço) e uma grande vitória no GP da Bélgica. Pra fechar a temporada, Senna ainda conquistou uma última pole no GP da Austrália, tirando tudo que era possível do Lotus 97T.

httpv://youtu.be/gbKbg-Bg8mk

Ao fim da temporada, duas vitórias, 7 poles, 6 pódios e a 4ª posição no campeonato de pilotos confirmaram a promessa que havia surgido em 1984. As expectativas para 86 eram ainda maiores.

A temporada 86 começou de maneira promissora. Uma pole position em casa, complementada com uma boa segunda posição, atrás apenas de Nelson Piquet. Na corrida seguinte, na Espanha, nova pole e uma vitória histórica sobre Nigel Mansell por míseros 0,014s, e a liderança do campeonato.

No GP dos EUA, ainda brigando pelo campeonato, Senna conquistaria uma excelente vitória nas ruas de Detroit, que os brasileiros elegeram como a “revanche” da eliminação da Seleção da Copa do México pela França, no dia anterior.

Em Budapeste, no GP da Hungria, Senna e Piquet protagonizaram um dos momentos mais antológicos da história da categoria, culminando em um movimento de Piquet que é tido como a maior ultrapassagem de todos os tempos.

httpv://youtu.be/3u8zzgw4d8c

Naquele ano, Senna conquistou 2 vitórias e 8 poles, mostrando que era o piloto a ser batido em classificações. Apesar dos bons resultados conseguidos na temporada, Senna apenas repetiu a 4ª colocação no campeonato, o que deve ser relativizado pelo fato de o título daquele ano ter sido um dos mais apertados de todos os tempos, com 3 pilotos disputando o título na última corrida.

Para 87, a Lotus perdeu o longevo patrocínio da John Player & Sons, e costurou nova parceria com a marca de cigarros Camel, alterando de maneira significativa a pintura do novo bólido, o 99T. Uma mudança ainda mais importante foi a chegada dos motores Honda à equipe britânica. A influência de Senna na decisão da Honda de aportar suas usinas de força na Lotus foi muito grande. Além disso, uma versão primitiva de suspensão ativa foi aplicada ao 99T, aumentando ainda mais a esperança de bons resultados.

A esperança, no entanto, não se materializou naquela temporada. Com apenas uma pole conquistada (pouco para seus padrões) e as mesmas duas vitórias da temporada anterior (uma delas em Mônaco, a primeira das seis obtidas no principado), Senna percebeu que se quisesse brigar por um título mundial, teria de se transferir para uma equipe de ponta.

Se valendo da grande influência que possuía sobre os japoneses da Honda, o piloto brasileiro costurou uma aliança entre McLaren e a fornecedora de motores para 1988, criando a base para aquele que seria o melhor carro de F1 de todos os tempos.

Já a Lotus, iniciava um caminho sem volta em sua história.

Cassio Yared

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Leia também:
“Chegando lá”, Senna na Toleman – Lucas Giavoni
“A batalha do século”, Senna na McLaren (1ª parte) – Marcel Pilatti
“Tri-talento”, Senna na McLaren (2ª parte) – Mário Salustiano
“Obra inacabada”, Senna na Williams – Márcio Madeira  

Especial Ayrton Senna
Especial Ayrton Senna
Por ocasião dos 20 anos da morte de Ayrton Senna, os colunistas do GPTotal dedicam uma série de textos ao tricampeão.

3 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Nada a acrescentar ao texto … resume de forma perfeita o que foi a boa passagem de Senna na Lotus …
    Acho que na Formula 1 não existiu carros mais bonitos que as Lotus … e digo isso desde os tempos do Jim Clark … até a derradeiro fim da parceria com a JPS em 1986 … mas se tem uma foto do Senna em que me amarro é esta de 1987 na Lotus já com o patrocínio da Camel …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  2. Robinson Araujo disse:

    Colegas do GPto

    A simbiose Lotus/Senna se mostrou extremamente interessante neste três anos de parceria, colhendo excelentes resultados ao conjunto mediano e permitindo a divulgação da qualidade de pilotagem do piloto brasileiro, o que lhe possibilitou, em 1988, o ingresso na dominadora Mclaren, o que levou Senna a chegar ao grau já propagado.
    Esta transferência certamente foi decisiva para sua carreira e para o circo da F1.

    Senna nos tempos de Lotus era velocidade pura e arrojo e a equipe lhe deu as condições, principalmente nos treinos, para brigar entre os grandes, sendo um constante incômodo para Mclaren e Williams.
    O motor Renault de classificação acabou se tornando lenda devido sua cavalaria com limites nunca divulgados e, em corrida, o brasileiro arrancava tudo e mais um pouco do conjunto, o que se demonstra em muitos abandonos por falta de combustível.
    Nelson Piquet certa vez argumentou que nestes tempos Senna largava com menos combustível para fazer espetáculo enquanto presente no GP, preferindo um abandono em uma ótima colocação a um sofrível quinto ou sexto lugar, o que, de certa forma, é uma visão comercial excelente. Em 1988, no GP do Japão a March de Capelli também utilizou deste recurso e perturbou a então inabalável Mclaren, deixando excelente impressão aos patrocinadores locais da Leyton House.

    A pintura fascinante também ajudou muito a equipe, se posicionando na memória coletiva, apagando, inclusive, para os leigos, a Lotus 72D de 1972, o grande ícone que iniciou esta personalidade.

    Excelente lembrar das Lotus de meados dos anos 80, época na qual iniciei neste fascinante universo.

    Uma boa semana a todos do GPto.

  3. Mauro Santana disse:

    Belo Texto Cassio!!

    O livro Herói Revelado de Ernesto Rodrigues conta em detalhes como tudo aconteceu para que Senna conseguisse costurar este triângulo de sucesso.

    Para quem não leu, vale a leitura.

    Apesar dos pesares, sempre achei muito lindo o Lotus 98T de 1986, sendo o meu carro predileto dos quais Senna pilotou.

    Bora pra Pedreira Paulo Leminski que hoje vamos curtir Motorhead, Ozzy e Judas Priest.

    \,,/ >_< \,,/

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

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