O Conto do Vigário 2

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(Leia a 1ª parte deste texto aqui: https://gptotal.com.br/o-conto-do-vigario-1/ )

Tom Walkinshaw estava cada vez mais molesto com o excesso de protagonismo que Flavio Briatore vinha desfrutando e sentia que seu trabalho não era reconhecido no sucesso da equipe Benetton.

Assim, ainda em 1995, Tom trata de conseguir sua própria equipe e chega a um acordo com Briatore para comprar as ações deste na equipe Ligier. Porém, Guy Ligier não estava disposto a vender a sua parte e Tom abandona o negócio. Numa conversa com Bernie Ecclestone, em Melbourne, em março do ano seguinte, este lhe fala sobre os problemas financeiros da equipe Arrows. Sem perda de tempo, lá vai Walkingshaw e compra as ações de Jack Oliver e de Dave Wass, os dois únicos sócios que restavam da equipe original.

Entrementes, Malik seguia com seus negócios e já era um entusiasta dos automóveis, desde que presenciou, adolescente, o British GP de 1977. Também possuía vários carros esportivos, entre eles alguns Ferrari, assim como presumia haver participado das 24 Horas de Le Mans com um Lamborghini, ainda que sob um pseudônimo. Em 1995, o ex piloto Ian Khan o apresenta a Eddie Jordan e Malik, mercê de seus bons contatos na Malásia e Indonésia, trata de conseguir patrocinadores para a equipe. Contudo, nada frutificou e a aparente boa relação entre eles termina de repente. Jordan nunca disse nada ao respeito.

Ao mesmo tempo que Walkinshaw assumia o controle da Arrows em 1996, Malik intermediava a compra da divisão de carros esportivos da Lotus pela malaia Proton. Com uma cada vez maior afeição pelo automobilismo, parece que Malik até tentou a compra da equipe Tyrrell em 1997, mas foi Craig Pollock quem finalmente ganhou a partida.

Noutra reviravolta da vida, aparece o construtor japonês Dome. Os japoneses, que nos últimos anos vinham tendo bastante sucesso com os sportcar, Fórmula 3 e 3000, decidem que já era hora de aspirar a mais e, no fim de 1995, a Dome anuncia sua intenção de competir na Fórmula 1. Um carro é construído e os testes começam no princípio de 1996 até que, durante um teste em Suzuka, uma fuga de óleo provoca um incêndio que acaba destruindo completamente o carro. Sem meios para construir outro e perante a falta de interesse de empresas japonesas em patrocinar o projeto, em meados de 1997 a Dome começa a buscar investidores fora do Japão.

Um dos mais interessados no projeto seria nosso príncipe Malik e Tadashi Sasaki, representando a Dome, se reúne com ele no hotel Hilton em Londres, no principio de 1998. Curiosamente, nesse mesmo dia em outra sala do hotel, a FIA tinha uma reunião com os chefes das equipes de Fórmula 1 e Sasaki, antigo membro da Minardi, se encontra com Walkinshaw, com quem conversa uns minutos, mas não lhe diz nada sobre o príncipe nigeriano com quem ia se encontrar. Na reunião, Malik insistia em querer inscrever a equipe no campeonato de 1999, algo que a Sasaki lhe parecia demasiado prematuro, pois ainda não tinham fornecedor de motor contratado. Sasaki e Malik até se reúnem com o presidente da Mugen-Honda, mas não conseguem o motor. Assim, no mês de maio, Sasaki definitivamente diz a Malik que era impossível por um carro na pista para a temporada seguinte… e tudo acaba aí.

Mesmo assim, Malik, estava decidido em conseguir uma equipe na Fórmula 1 e, no fim do ano, entra em contato com Walkinshaw. O entusiasmo do príncipe logo cativa o escocês, pois tinha grandes projetos e, segundo parecia, dinheiro para investir pesado. A Arrows continuava numa difícil situação financeira e, com o fim do contrato de patrocínio com Danka, precisava dinheiro para liquidar dívidas. Assim, Walkinshaw logo se deixou seduzir quando Malik apareceu trazendo consigo o banco alemão Morgan Grenfell Private Equity. Malik vinha fazendo negócios com esse banco e o convenceu a investirem juntos na Arrows. Vale recordar que esse banco, no fim desse mesmo ano de 1999, chegaria a um acordo com Ecclestone para comprar ações da SLEC Holding, a empresa que detinha os direitos comercias da Fórmula 1, por valor de 325 milhões de dólares.

Malik havia prometido a Walkinshaw um investimento por valor de 125 milhões de dólares, a serem depositados no fim de setembro. Também menciona a possibilidade de aproveitar seus contatos com a Lamborghini, para negociar o uso de motores italianos. A proposta de Malik era colocar nos carros publicidade de sua marca de bebidas energéticas T-Minus para conseguir a sua promoção internacional e com o objetivo de estender suas atividades a outras áreas e produtos, como roupa esportiva, complementos e até motocicletas, assim como oferecer a marca  sob licença a fabricantes que estivessem interessados em usufruir da sua exposição mundial, aumentando assim seus benefícios. Esperava-se que, conforme a marca ganhasse notoriedade, alguns dos licenciados acabassem contratando publicidade no carro, aumentando a receita da equipe. O príncipe também assegurava ter um contrato com Lamborghini para o lançamento de uma edição especial de um de seus modelos com as cores de T-Minus.

Malik queria emular o feito por Dietrich Mateschitz, que havia visto na Fórmula 1 uma excelente maneira de promover sua recém criada marca de bebida energética Red Bull, com ótimos resultados desde que a marca aparecesse por primeira vez nos carros da Sauber em 1995.

Porém, com a temporada já em andamento, o esperado dinheiro não chegava. Apenas algumas centenas de latas de T-Minus haviam sido produzidas para serem distribuídas a modo de promoção no paddock, mas nenhum dinheiro seria arrecadado graças à marca até setembro (se foi, este não chegou à equipe). Quando Malik tinha que depositar o investimento prometido, ele simplesmente não apareceu, deixando a Arrows numa situação realmente delicada, se mantendo duramente graças ao patrocínio da Repsol, que apoiava a Pedro de La Rosa. Deste modo e com o príncipe desaparecido, para os dois últimos GPs da temporada, o nome T-Minus já havia sido retirado dos carros.

Concluímos a história de Tom Walkinshaw em nosso próximo encontro, em 17 de setembro

Abraços

Manuel Blanco

Manuel Blanco
Manuel Blanco
Desenhista/Projetista, acompanha a formula 1 desde os tempos de Fittipaldi É um saudoso da categoria em seus anos 70 e 80. Atualmente mora em Valência (ESP)

1 Comment

  1. Bslnew disse:

    Como tem negócios “obscuros” na F1…
    :/

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