Todas as expectativas que cercaram o GP da Itália e a batalha entre os pilotos da Mercedes acabaram sendo resolvidas numa espécie de anticlímax.
Após a polêmica das ordens de equipe (não obedecidas) na Hungria, e o toque evitável em Spa, a aguardada batalha entre os pilotos da Mercedes no templo sagrado de Monza acabou sendo decidida numa espécie de anticlímax. Quando Hamilton, pole e favorito à vitória, conseguiu finalmente se recuperar de uma largada miserável e iniciava um ataque efetivo ao companheiro de equipe, tudo acabou se decidindo num erro até certo ponto infantil de pilotagem por parte de Rosberg.
Em meio a tantas semelhanças com a temporada de 1988, o episódio avançou um ano e fez lembrar o GP da Alemanha de 1989. Naquela ocasião, com a briga entre Senna e Prost já declarada e irreconciliável, o brasileiro perdeu tempo nos boxes e iniciou uma perseguição alucinada ao francês, ambos baixando o ritmo em mais de três segundos por volta. O destino, porém, guardou para si a definição sobre qual teria sido o desfecho da corrida, ao roubar a sexta marcha de Alain Prost a pouco mais de duas voltas do fim. Exatamente como fez agora, a partir da freada perdida por Rosberg.
Em 1989, Hockenheim acabaria sendo o ensaio para o confronto épico de Suzuka que, polêmicas e batidas à parte, encerrou uma das maiores corridas de todos os tempos. Resta-nos esperar que o desfecho do atual campeonato possa reservar batalhas de qualidade parecida, sem interferências de falhas mecânicas, erros bobos ou batidas intencionais.
Logo veremos.
A prova de Monza em poucas palavras.
Apagadas as luzes vermelhas, algumas largadas nada convencionais. Partindo do lado emborrachado, Hamilton – e principalmente Bottas – apresentaram péssimo arranque, contrastando com o vigoroso salto da McLaren de Magnussen, posicionada logo atrás na mesma coluna. Vencida a chicane, a ordem mostrava Rosberg, Magnussen, Massa, Hamilton, Vettel, Button, Pérez, Alonso, Hülkenberg, Bottas, Räikkönen e Ricciardo.
Nas curvas seguintes, um Kimi aparentemente renovado tratou de jogar a Williams do compatriota para fora do top ten, ampliando ainda mais a bem-vinda desarmonia existente entre a hierarquia de ritmos de prova e o posicionamento observado em pista. Em essência, afinal, é esta a condição básica para que existam disputas e ultrapassagens legítimas.
Desde muito cedo ficaria claro que Kevin Magnussen estabeleceria a linha divisória ao longo da corrida. Seu posicionamento muito à frente do que o ritmo permitia o colocava como zagueiro a ser superado rapidamente por quem vinha atrás, sob pena de Rosberg se tornar rapidamente inalcançável lá na frente. Ruim para Massa e péssimo para Lewis, incapaz de superar nas retas a assombrosa velocidade de uma Williams andando no vácuo de outro carro. Foram necessárias cinco voltas, e algumas custosas travadas de pneus numa corrida que deveria ter apenas uma troca, para que Felipe finalmente conseguisse assumir a segunda posição, trazendo Hamilton a reboque.
Com três dos quatro conjuntos mais rápidos correndo livres, e o restante limitado pela presença de Kevin, o pódio só não estaria definido caso houvesse alguma intervenção do safety car – algo especialmente raro quando o cenário é Monza. Restava, no entanto, definir o ordenamento dos três primeiros.
Durante algumas voltas Felipe pareceu ter condições de virar no mesmo tempo de Rosberg, e quando o alemão perdeu a chicane pela primeira vez, na nona volta, houve quem previsse erroneamente que o brasileiro iria assumir a ponta. Todavia, quando Hamilton conseguiu carregar mais velocidade na saída da Parabólica, Felipe limitou sua defesa a tomar a linha de dentro na aproximação da chicane. Coisa rara em sua carreira, Massa não eliminou o espaço de seu concorrente, cuidando para não tomar parte em qualquer toque que pudesse tirá-lo de sua posição privilegiada. De imediato Rosberg e Hamilton baixaram o ritmo em cerca de 7 décimos, e agora seria batalha aberta entre os dois, com Felipe voando sozinho e tranquilo na terceira colocação.
Lá atrás Bottas confirmava a boa forma da Williams, deixando para trás Räikkönen, Pérez, Alonso, Button e Magnussen. Quando o finlandês finalmente alcançou a quarta posição e passou a ter pista livre, restavam 32 voltas e ele tinha 12 segundos de desvantagem para o companheiro de equipe. Seria ele capaz de reverter a situação?
Não, não seria. Nas voltas que ambos completaram antes de rumar aos boxes o brasileiro sustentou a diferença, que se revelaria fundamental para o posicionamento de retorno à pista. Afinal, enquanto Massa voltaria numa confortável quinta posição, atrás do próprio Bottas e de Ricciardo, e seis segundos à frente de Vergne, Bottas descobriria da pior forma que os pneus duros novos rendiam mais que os médios usados, e haviam permitido que vários conjuntos pudessem recuperar terreno. Agora, ele teria que ultrapassar mais uma vez a Pérez, Magnussen e Vettel. Massa estava garantido no pódio, onde poderia comemorar a confirmação de seu contrato com a Williams para 2015.
Entre os líderes, Hamilton passou a descontar a distância de maneira mais vigorosa após os pit stops, e estava abrindo briga direta quando o companheiro perdeu a chicane e a liderança na 29ª volta. Entre os demais pilotos, destaque apenas para Ricciardo, que fez ótimo uso dos pneus mais novos e da mais alta velocidade final registrada em Monza (362 km/h!) para escalar o pelotão até o 5º posto, atrás de Mercedes e Williams, deixando o companheiro tetracampeão nos retrovisores mais uma vez.
No balanço final, uma vitória importante para Hamilton, que segue vivo e com moral na briga pelo título. Para Massa, o demorado pódio veio num momento excelente, justificando parcialmente o voto de confiança da equipe e ajudando a Williams a superar a Ferrari entre os construtores.
Temos citado muito a temporada de 1988 em nossas análises, por encontrarmos nela o paralelo da equipe cuja soberania terminou por acirrar a níveis extremos a rivalidade entre seus pilotos, de estilos diferentes, mas igualmente postulantes ao título.
Pois bem, foi em Monza, naquela temporada, que a meu ver Alain Prost deu a maior aula de sua carreira. Em nenhuma outra corrida de meu conhecimento um piloto conseguiu identificar um problema mecânico com tanta precisão e antecedência, e a partir disso foi capaz de elaborar estratégia tão complexa e eficaz enquanto pilotava, sem trocar informações com a equipe. Tudo se passando apenas em sua cabeça, na solidão do cockpit.
Se alguém quiser ler mais sobre aquela prova, basta clicar aqui.
Uma ótima semana a todos.
6 Comments
Creio que essa saída de pista do Rosberg foi tão acidental quanto a que ocorreu na classificação para Monaco.
Imaginem a seguinte ficção.
Rosberg admite que bateu de propósito no Hamilton no GP da Belgica.
Para amenizar a sua situação na equipe, promete “pagar” o prejuízo que causado ao Hamilton na corrida seguinte no GP da Itália.
Ele é sabedor que o Circuito de Monza é totalmente favorável aos motores da Mercedes, que a Willians usando propulsor idêntico não tem o mesmo ritmo de corrida deles e que a RBR nem vai chegar perto por causa do fraco motor Renault.
O que pensa o Rosberg? … Eu posso cometer um pequeno erro para o Hamilton ganhar a corrida e assim apaziguar o ambiente dentro da equipe.
O que não estava no script era o Hamilton fazer uma largada ruim.
Não tem problema, vou errar duas vezes no mesmo lugar por que se perder a posição pro Massa, logo a recupero e fico na minha tranquilo atrás do inglês.
Fernando Marques
Olha Fernando, eu não duvido, e é de se pensar.
Abraço!
Excelente GP, e pena que não rolou uma disputa na pista entre as Mercedes.
Massa soube aproveitar bem a vantagem que conseguiu na largada, e vamos ver se agora ele consegue fazer belas provas novamente.
E Márcio, este texto do ultima volta é fantástico, já li uma porrada de vezes e o Prost naquele GP de Monza foi Maquiavélico demais da conta.
Abraço!
Mauro Santana
Curitiba-PR
Naquele GP de Monza de 88, eu queria ter visto a cara do Prost quando o Senna abandonou, rsrs.
O Professor era sarcástico!!
O GP da Itália este ano foi muito bom.
Monza assistiu uma corrida com incessantes disputas do inicio ao fim da corrida.
A disputa entre Hamilton e Rosberg entretanto está sob suspeita. Apesar de ter cometido o mesmo erro no inicio da prova, apesar da pressão do Hamilton que vinha tirando diferença aos poucos, o erro na chicane não fez muito sentido. Rosberg ainda tinha mais de 1 segundo de vantagem e não estava sofrendo nenhuma tentativa de ultrapassagem por parte do Hamilton. Ficou algo estranho no ar apesar dos desmentidos de todos na Mercedes.
A corrida do Massa foi a certamente a sua melhor do ano. Até ultrapassagem ele fez. Algo raro.
A corrida de V. Bottas foi com certeza digna da melhor performance entre todos que correram em Monza. Ele largou mal (ou de repente foi atrapalhado pela largada ruim de Hamilton) e ainda tomou uma ultrapassagem do Raikkonen. Depois disso só fez ultrapassar e levantar poeira em quem ficava para trás. Quando atingiu o 4ª colocação, após o pit stop ai sim pode relaxar um pouco pois não tinha como alcançar o Massa. Só que partir deste momento surgiu o Daniel Ricciardo, antes até esquecido por todos na corrida, para dar o seu show. Trabalhou tanto quanto Bottas para superar quem estava a sua frente. A batalha que ele travou e ganhou com Vettel deveria ser gravada e mandada de presente para a Mercedes, tentando assim ensinar como dois pilotos da mesma equipe podem batalhar numa corrida sem um bater no outro. Tudo bem que Riciardo tinha mais carro e pneu ao fim da corrida, mas a forma como Vettel tentou defender a posição acabou por dar muito trabalho ao australiano. Foi a ultrapassagem mais bonita da prova.
No fim me chamou a atenção da festa no podium. Os tiffosi festejaram como nunca o Massa e vaiaram como nunca o Rosberg, que pelo visto virou o mais novo dick vigarista da Formula 1.
Fernando Marques
Niterói RJ