Menino de rua

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Sérgio Pérez conquistou nesse domingo sua quinta vitória na F1, mas uma curiosidade chama atenção: foi a quarta vitória em circuitos de rua. Outro detalhe é que o mexicano tem apenas duas poles. As duas no velocíssimo circuito de rua de Corniche, em Jidá, nas margens do Mar Vermelho. Para ter sucesso em pistas citadinas, o piloto precisa ser muito preciso e essa é uma das características principais de Checo, mas a grande verdade foi que se não fosse a quebra do semi-eixo de Max Verstappen durante a classificação no sábado, o mexicano dificilmente venceria a prova de hoje.

Quando Max Verstappen ficou lento ainda no Q2, imediatamente Sérgio Pérez tinha uma meta para si: vencer ou vencer em Jidá. Com o melhor carro disparado do pelotão, Checo tinha que aproveitar o infortúnio de Max para voltar a vencer na F1 e o fez com tremenda categoria, perdendo a liderança do campeonato apenas na última volta de hoje, quando Verstappen tirou a melhor volta da corrida da cartola.

A quinzena entre as corridas no Bahrein e na Arábia Saudita foi uma espécie de estado de negação para a F1. Se a Red Bull bateu recordes de vitória em 2022, a sensação após o massacre na pista do Sakhir era que não apenas esse domínio se repetiria, como a Red Bull poderia até mesmo aumentar essa supremacia. Melhorar a performance da McLaren em 1988 e vencer todas as corridas da temporada? Para George Russell, sim, isso era possível da Red Bull conquistar. No entanto, muita gente importante dentro do paddock da F1 questionou essa possibilidade. Afinal, a pista de Sakhir e Corniche são muito diferentes entre si. Será que Sakhir é uma pista que simplesmente potencializou os pontos fortes da Red Bull? O final de semana em Corniche respondeu com um sonoro ‘não’ a esse questionamento e jogou um verdadeiro balde de água fria a quem sonha com uma temporada emocionante pela frente. Se não fosse o problema com Verstappen no sábado, a corrida desse domingo seria ainda mais fácil para a Red Bull e muito provavelmente o neerlandês venceria, com Pérez completando a dobradinha. A quebra no carro de Max apenas aumentou a dificuldade da missão da Red Bull nesse domingo, enquanto Sérgio Pérez fez o básico para vencer pela primeira vez em 2023, com Max Verstappen completando a dobradinha superando treze carros que largaram na sua frente sem maiores arroubos.

Porém, fica para a Red Bull duas tarefinhas de casa para fazer. Primeiro é tentar apaziguar a sua dupla de pilotos. Por mais que disfarcem, ainda há muito rancor entre Verstappen e Pérez pela segunda metade da temporada passada e a forma como Checo suspeitava se Verstappen iria ou não baixar seu ritmo somente escancara a falta de confiança que o mexicano nutre para com seu companheiro de equipe, que mesmo escutando todo o barulho do mundo vindo do seu carro, Verstappen economizou bateria para marcar a volta mais rápida da corrida na passagem derradeira, roubando o pontinho que daria à Pérez a liderança do campeonato. Pérez pareceu não ter gostado muito desse surpresa final quando foi informado depois da prova.

Outro ponto é a confiabilidade dos carros. No sábado Verstappen teve um problema no semi-eixo que o relegou a décima quinta posição do grid e na corrida, os dois pilotos relataram problemas em seus carros via rádio. Contudo, a sensação que passou foi que Pérez e Max falavam aquilo apenas para deixar os telespectadores acordados…

Em certo momento da corrida, a transmissão da TV resolveu focar na emocionante briga pela décima quinta posição entre Logan Sargeant e a dupla da McLaren. Só isso já explica bastante que a corrida na Arábia Saudita não foi das mais emocionantes. A ótima largada de Fernando Alonso nem causou maiores sobressaltos para quem acompanhou a corrida, pois além de Alonso ter sido punido por ter estacionado seu Aston Martin fora do colchete, o ritmo da Red Bull era nitidamente superior e rapidamente Pérez estava na ponta. Mesmo tendo cometido uma senhora besteira na largada, Alonso tem experiência o suficiente para não brigar com Pérez, como também se aproveitar por algumas voltas o DRS para ‘puxa-lo’ nas retas, o deixando os suficientes 5s longe de Russell, que era o tamanho de sua punição.

Mais atrás, Verstappen largou de forma convencional, se livrando de algum toque e quando a corrida se assentou, foi ultrapassando a todos que via pela frente, rapidamente chegando ao top-6, após ultrapassar Hamilton. Porém, um Safety-Car mudaria um pouco a cara da corrida e ajudaria sobremaneira Verstappen. Com alguns pilotos já tendo feito suas paradas, o SC fez com os líderes completassem suas paradas e, mais importante, deixasse Verstappen em quarto, colado no pelotão. Com apenas Alonso e Russell separando os dois carros da Red Bull, Pérez sabia que precisava de uma relargada perfeita e assim o fez, deixando Max tendo que lidar com dois carros nitidamente mais lentos, mas combativos, enquanto Checo tinha pista livre para abrir o máximo possível. Quando Max ultrapassou Alonso, Pérez tinha confortáveis 6s de vantagem, que o chicano administrou de forma aconchegante até a bandeirada.

Com a Red Bull tão superior aos demais, a corrida atrás dos austríacos foi bem animada, certo? Bom, basta dizer que após a relargada na metade da corrida, afora as ultrapassagens de Max, o pelotão permaneceu o mesmo, com Alonso liderando na frente de três pares de carros: Mercedes, Ferrari e Alpine, nessa ordem. Com os pilotos fazendo de tudo para não terem que ir para uma segunda parada, praticamente todos os pilotos que estavam no top-9 (a exceção foi Hamilton) colocaram pneus duros e diminuíram o ritmo para levar o carro até o final. Sem querer forçar, a corrida ficou estática no pelotão da frente, somente com os pilotos da Red Bull tentando alguma coisa e com isso, abrindo 15s para Alonso.  Foi uma corrida longe de empolgar os mais aguerridos fãs da F1, mas eles teriam outro motivo para estar desejando fazer outra coisa nessa tarde de domingo. Na quinzena anterior Esteban Ocon fez uma corrida horrorosa, cheia de punições e parece que Alonso quis imitar seu antigo companheiro de equipe. Assim como o francês, Alonso largou fora do lugar no grid e foi punido por isso. E como aconteceu com Ocon, quando foi cumprir a punição, Alonso teve seu carro tocado antes da hora pelos seus mecânicos, mais especificamente, quem manuseia o macaco traseiro.

Porém, a FIA esperou trinta e cinco voltas para anunciar uma punição de 10s para Alonso, tirando o histórico centésimo pódio do espanhol, além de ter tirado a chance do espanhol descontar esses 10s para o seu mais próximo perseguidor. Será mesmo? A Aston Martin recorreu da segunda punição e horas mais tarde, quando George Russell já estava com troféu de terceiro lugar nas mãos e provavelmente voltando para a Inglaterra, a FIA mudou tudo e devolveu o terceiro lugar para Alonso.

Por sinal, a FIA já tinha cometido um erro amador quando colocou o Safety-Car na pista quando Lance Stroll abandonou com problemas na sua unidade de potência e o canadense estacionou seu Aston Martin num lugar bem seguro, onde o SC Virtual resolveria o problema sem maiores distúrbios no andamento da corrida. Porém, a direção de prova confessou que pela imagem que tinham, não sabiam onde Stroll estava…

Ou seja, passam-se os anos e a zona da direção da FIA após a morte de Charlie Whitting continua.

Mercedes e Ferrari vão se constituindo nas grandes decepções nesse início de campeonato. Os alemães chegaram a saborear por algumas horas um pódio com Russell, mas deverão ter que devolveu o troféu e rever o conceito de ‘zeropod’. A Mercedes ficou atrás da Aston Martin em ritmo de corrida e fez uma prova discreta, com Hamilton terminando em quinto. A Ferrari veio logo atrás, com Sainz na frente de Leclerc, sendo que o monegasco teve que pagar uma punição precoce por troca de peças do motor e apesar de largar com pneus macios, fez sua parada depois de Sainz, que largara com borracha de dureza média, denotando uma performance superior ao do companheiro de equipe. Contudo, quando Leclerc calçou os pneus duros, nada fez para superar Sainz, que fez outra corrida sem sal, onde tomou uma ultrapassagem por fora de Lance Stroll nas primeiras voltas. A Ferrari ainda faz um trabalho bom nas classificações, mas o ritmo simplesmente some nas corridas, particularmente com os pneus mais duros. A Alpine colocou seus dois pilotos no Q3 e os viu marcar pontos em oitavo e nono, numa corrida bem burocrática de ambos, mas que trouxe pontos para deixar os franceses como quinta força do ano nesse momento. Magnussen batalhou bastante com Tsunoda pelo último ponto do dia, só conseguindo a ultrapassagem decisiva nas voltas finais, para tristeza do nipônico, que pela segunda corrida consecutiva recebeu a bandeirada em 11º, um posto atrás dos pontos. A McLaren continua em seu calvário e chegou a ocupar as duas últimas posições com seus jovens pilotos, que devem estar se perguntando se era necessário brigar tanto para estar na McLaren, quando tiveram chances concretas de estar em outros lugares.

No final do dia, Pérez se consolidou como um ‘menino de rua’ com mais uma vitória num circuito citadino, porém, o mexicano sabe muito bem que o triunfo veio muito pelo problema com Verstappen, que vinha dominando todo o final de semana até o Q2. A diferença da Red Bull para as demais é hoje tão grande que até mesmo assusta. A cúpula da Red Bull foi colocada acima do pódio hoje e é dessa posição que a equipe austríaca vê seus rivais em 2023: bem no alto, longe de serem alcançados.

Abraços!

João Carlos Viana

JC Viana
JC Viana
Engenheiro Mecânico, vê corridas desde que se entende por gente. Escreve sobre F1 no tempo livre e torce pelo Ceará Sporting Club em tempo integral.

2 Comments

  1. Olá Fernando!

    Sim, na coluna é falado que a festa do seu xará valeu!

  2. Fernando Marques disse:

    J. C. viana,

    o resultado final da corrida me surpreendeu … quando vi que Vertappen já 2º lugar, para mim a corrida tinha acabado pois achei que Peres seria obrigado a ceder a liderança da corrida.
    As RBR estão muitos degraus acima das outras equipes. Verstappen passou como quis ou não quis sobre todos que estavam a sua frente … asa movel pareceia um acessório apenas decorativo tal grande era superioridade na pista.
    Fernando Alonso acabou recuperando o terceiro lugar e a festa do pódio acabou valendo

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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