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A segunda parte das comparações entre pilotos e jogadores. Quem seria o Emerson Fittipaldi ou o Alain Prost do futebol? E o Zidane ou o Messi da Fórmula 1?

Dando sequência à coluna que publiquei dia 2 de julho, vou hoje falar sobre outros 10 pilotos de F-1 e jogadores de futebol que integram o seleto rol de maiores nomes da história.

Muita gente boa ficou de fora (Mansell, Charlton, Zico, Hakkinen, entre outros…). “Questão de espaço e também de tempo”, como diz Lulu Santos. Aliás, uma coisa interessante nesse exercício de comparação é ver como – talvez pelo fato de haver MUITO mais jogadores do que pilotos – os nomes da F-1 possuem traços distintos que os permitiriam ser comparados a diversos jogadores.

Isso posto, vamos lá.

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Além de serem italianos e bicampeões mundiais, Alberto Ascari e Giuseppe Meazza têm muito em comum. São os primeiros superastros por excelência dos referidos esportes. É claro, quando Ascari iniciou já havia um Farina e, mais ainda, um Fangio, mas foi o “Gordinho” quem antes atingiu o patamar de monstro: ele foi o primeiro piloto a vencer dois campeonatos mundiais e de quebra estabeleceu uma série de recordes após seu bicampeonato.

Em 1953, Ascari atingiu a lendária marca de 9 vitórias seguidas na F-1 (há a eterna discussão sobre 7 ou 9, contando ou não as 500 milhas da qual nem Ascari nem piloto europeu algum participava) e ainda outras marcas antológicas. Meazza permaneceu longos anos como o maior artilheiro de sua seleção e do campeonato italianos e, ao lado de Pelé e Garrincha, é o único a disputar e vencer duas finais de Copa do Mundo como principal jogador.

Mas, por serem os primeiros, têm no tempo o maior inimigo: “só ganhava porque tinha uma Ferrari imbatível”, “só ia bem na seleção por conta do fascismo”, etc. Com o passar dos anos, seus belos feitos vão sendo relativizados. Mas Meazza dá nome ao maior estádio da Itália, e Ascari nomeia uma das mais famosas curvas de Monza.

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O próximo comparativo também fala de dois nomes que obtiveram conquistas históricas, mas que não puderam ir além: Emerson Fittipaldi e Eusébio da Silva Ferreira. Compará-los vai muito além do fato de terem a mesma língua materna e as mesmas iniciais de nome e sobrenome.

Emerson e Eusébio são dois verdadeiros desbravadores, e colocaram seus países no mapa do esporte. Os Sennas, Cristianos, Figos e Piquets que surgiriam mais tarde talvez não existissem sem suas figuras primordiais.

Eusébio surgiu para o mundo em 1962, ao ganhar a Copa dos Campeões em cima do lendário Real Madrid de Puskas e Di Stefano. 10 anos mais tarde, Emerson vencia seu primeiro campeonato mundial, a bordo da Lotus que lhe dera a 1ª vitória.

Depois de uma Bola de Ouro (em 1965) para Eusébio e outro mundial (1974) para Emerson, os dois encaram as missões mais nobres – e ingratas – de suas vidas: levar as cores de seus países ao topo do mundo: Eusébio jogou a primeira Copa da história de Portugal, e Emerson fundou a única equipe brasileira que já existiu.

Nenhum dos dois chegou ao título mundial, mas isso não os diminui em nada: Eusébio foi artilheiro da Copa de 1966 e tem em sua conta uma média de gols maior que a de Pelé, e Emerson é o único piloto a vencer dois mundiais de F1 e duas 500 Milhas de Indianápolis.

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Outro bicampeão da lista é Fernando Alonso, mas não encontro nenhum paralelo possível com jogadores do futebol do presente: vejo-o semelhante a Marco van Basten.

Alonso, assim como Basten, é ídolo da maior instituição italiana da sua área, e teve suas maiores conquistas ainda aos 24 anos: o piloto vencia o mundial sendo, à época, o mais jovem a atingir tal feito, e o jogador ganhava a Eurocopa depois de vários meses parado devido a graves lesões.

Depois, Alonso venceria mais um mundial e faria corridas antológicas, e à Euro de Basten se juntariam duas Champions, dois Mundiais e 3 Bolas de Ouro. Basten teve a carreira muito abreviada em virtude de lesões (aos 28 já se aposentara) e Alonso amargou temporadas em carros péssimos.

O que mais aproxima os dois é o fato de serem completos: Alonso é um piloto horizontal, como definiu Márcio Madeira: muito bom em treinos, ótimo em corridas e excelente em campeonatos. E Basten é um dos maiores camisas 9 de que já se teve notícia: ambidestro, ótimo driblador, exímio cabeceador e um grande improvisador.

Por tudo isso, não há dúvidas de que merecem estar no padrão dos maiores de todos os tempos, mas “a” chance de terem alçado o topo já passou: Basten não foi bem na única Copa do Mundo da qual participou (1990), e Alonso, ganhe quantos campeonatos for, sempre terá o “asterisco” dos mundiais de 2007 e 2010.

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O outro paralelo a ser traçado é entre dois nomes que são bastante (re)conhecidos não apenas pelo talento mas também pela atuação em prol do esporte: Jackie Stewart e Michel Platini.

Em termos de conquistas, Stewart estaria acima, afinal são três mundiais, enquanto que Platini não conheceu a glória de vencer uma Copa. Mas o francês teve uma Euro, uma Champions e três bolas de Ouro consecutivas – recorde só igualado por Messi. Stewart também detém recorde de sequências: até hoje é o piloto que mais GPs liderou seguidamente: 17.

Seus estilos de atuação também se assemelham uma vez que podiam não ser os craques mais vistosos nem espetaculares, mas eram alguns dos mais eficientes de suas gerações. Mas talvez seja fora de campo e pistas que mais se assemelhem.

Platini dirigiu a seleção francesa em várias temporadas e Stewart montou sua própria equipe, no fim dos anos 90. Platini é o presidente da UEFA e participa ativamente na ampliação do alcance do futebol. Também fez parte do comitê organizador da Copa do Mundo de 1998. Jackie Stewart já chegou a ser cogitado na presidência da FIA, e foi um dos ícones da melhora da segurança na F1.

Mas mesmo com tantos predicados não alçaram a posição de maiores ídolos em suas terras natais: se Stewart tem um Clark, Platini tem um Zidane.

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E é justamente com o franco-argelino que faremos outro comparativo. Zinedine Zidane é uma espécie de Graham Hill do futebol.

É claro que Zidane teve algumas manchas em sua carreira, a maior delas sendo a expulsão na final do mundial de 2006 —quando teria a chance de ser ladeado a Pelé—, mas quando se fala do seu futebol é simples: foi um dos meias mais cerebrais e técnicos da história. Graham Hill também, na Fórmula 1, ficou conhecido por sua elegância ao dirigir, embora fosse menos audacioso.

Suas vidas fora de campo também são semelhantes: são caras “família” não apenas por serem avessos a badalações mas por incentivarem seus filhos a seguir seus passos.

Mas o que mais os aproxima é o fato de serem deles marcas hoje inimagináveis: Zidane ganhou todos os grandes campeonatos que disputou (Copa do Mundo, Eurocopa, Champions League, Serie A e Mundial) além de ser um dos três jogadores da história a marcar 3 gols em duas finais de Copa (apenas Pelé e Vavá obtiveram o mesmo feito), e Graham Hill é o único da história a vencer as três maiores corridas do automobilismo e o mundial de Fórmula 1.

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Como eu falei na primeira coluna, o comparativo entre os pilotos e jogadores não se dará através das posições deles em meu ranking pessoal: Johan Cruyff é um dos maiores da história do futebol, posição essas que não é a ocupada por John Surtees na F-1.

Porém, o piloto inglês é dono daquela que talvez seja a mais impressionante marca de todos os tempos: é o único piloto a ser campeão mundial sobre duas e quatro rodas. Isso mesmo: John Surtees foi campeão nas motos 500 cc (4x!) e na Fórmula 1, em 1964. Cruyff é por muitos considerado o jogador mais versátil da história, e um verdadeiro ícone do futebol moderno: a Laranja Mecânica de 1974 é até hoje referência, vide Barcelona.

O Barça, aliás, é outro fator que os aproxima: Cruyff teve grandiosa carreira como jogador e depois foi técnico no clube catalão (ganhando uma Champions e quatro Campeonatos Espanhóis como treinador), e Surtees também seguiu carreira de dono de equipe. Surtees não obteve o mesmo sucesso como dirigente. Mas Cruyff também não ganhou a Copa do Mundo como jogador (ela ficou com Beckenbauer). Então, elas por elas.

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E já que citamos o alemão, a próxima comparação é com ele: Franz Beckenbauer é o Jack Brabham do futebol.

Zagallo também conquistou Copas como jogador e técnico, mas Beckenbauer é um caso diferente: primeiro porque ele não teve Pelé, Garrincha, Didi, Gerson, etc, como companheiros nem comandados, e segundo porque sua atuação como treinador em 1990 foi muito mais importante que a de Zagallo em 1970 (João Saldanha, who?).

Da mesma forma, Brabham – para sempre o único piloto a ser campeão mundial com o próprio carro (depois de haver vencido dois) – foi decisivo na construção de sua equipe mais que qualquer bicampeão que tenha mudado de escuderia e voltado a ser campeão posteriormente.

Brabham jamais teve uma condução inspirada como a de alguns de seus contemporâneos. Beckenbauer era jogador de defesa. Mas os dois conseguiram se tornar os maiores nomes da F1 e do futebol em dada época através de muito esforço e dedicação. E uma boa dose de elegância.

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Beckenbauer foi o líder e craque da seleção alemã campeã de 1974, mas talvez sem Gerd Müller o título não viesse. O grande artilheiro alemão é uma espécie de Alain Prost do futebol.

O fato de Gerd ter sido um daqueles centroavantes clássicos faz com que muitos questionem sua qualidade técnica. E Alain Prost nunca teve um estilo de arrojo e velocidade que arrebatasse fãs como seus maiores rivais.

Porém, Müller e Prost têm em comum o fato de terem conquistado diversos e assombrosos recordes, superando de longe pilotos e jogadores que podem ser considerados melhores que eles no quesito talento e estilo.

O alemão era, até 2006, o maior artilheiro da história das Copas, feito superado por Ronaldo; Prost deteve por alguns bons anos o recorde de vitórias, pódios e pontos, até ser superado por Schumacher. E por décadas se manteve como o maior artilheiro do futebol mundial num só ano, marca que Messi deverá superar em breve.

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Jochen Rindt é um caso que se situa entre Stefan Bellof e Ayrton Senna/Jim Clark na F1.

Explico: não quanto à posição na história, mas sobre algo concreto: Bellof morreu como promessa, Senna e Clark como mais do que certezas (como Di Stefano e Garrincha, pois). Já Rindt foi aquele cara que fez coisas impressionantes, mas que não se tinha certeza de onde exatamente teria chego. Por isso, se assemelha muito a Just Fontaine no futebol – pra quem quiser relembrar, Bellof seria o Denner.

Rindt disputou 60 GPs, saindo da pole em 10 deles e vencendo seis. Venceu 4 provas consecutivas em 1970 e foi consagrado campeão mundial após a lendária vitória de Emerson Fittipaldi. Fontaine obteve uma média de gols/jogo de quase 0,9, e permanece sendo o maior artilheiro de uma mesma edição de Copa do Mundo: 13 gols em seis partidas no Mundial de 1958.

Mas os dois tiveram suas carreiras abortadas muito precocemente: Rindt faleceu antes do fim do campeonato de 70 e é até hoje o único campeão póstumo. Fontaine teve sua perna quebrada em três partes após entrada duríssima de um adversário e nunca mais jogou futebol. Ambos tinham 28 anos.

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Falando em juventude e em marcas históricas, a próxima comparação é um pouco mais óbvia e por isso mesmo necessária: Sebastian Vettel é o Lionel Messi da Fórmula 1.

Separados por apenas 9 dias (Messi nasceu em 24/06/1987 e Vettel a 03/07 do mesmo ano), os dois atletas têm em comum não só a idade mas o fato de terem sido lapidados em equipes que investiram pesado desde que eram ainda moleques. Detêm inúmeros recordes de juventude e outros tantos de temporadas, e já flertam com a ansiedade da imprensa em alçá-los às condições de Pelé, Fangio, Maradona, Senna, etc.

Flertam, também, com essa coisa insana de estarem sendo o tempo todo vigiados e julgados: um deslize deles, por menor que seja, é elevado à condição de fracasso: se Vettel não faz 5 hat-tricks em sequência, dizem que “sem carro não consegue fazer nada”. Se Messi erra um pênalti numa semi-final de Champions League, se torna alguém que “amarela em momentos decisivos”.

Portanto, a saída de Pep Guardiola do Barça e as eternas mudanças de regulamento da F1 são as chances de darem voltas por cima. Sem que tenham caído.

Abraços a todos.

Marcel Pilatti
Marcel Pilatti
Chegou a cursar jornalismo, mas é formado em Letras. Sua primeira lembrança na F1 é o GP do Japão de 1990.

4 Comments

  1. Cassio disse:

    Como foi bem destacado no início da coluna, este tipo de comparação permite ladear muitos pilotos e jogadores diferentes, devido à diversas características. Da lista apresentada nesta coluna, acredito que Messi X Vettel e Platini X Stewart sejam as comparações mais diretas. Quanto às outras comparações, é um belo exercício de história do esporte, feito com muito afinco, que leva a traçar paralelos entre os pilotos e jogadores. Muito bom!

    abraço

    Cassio

  2. Marcel Pilatti disse:

    Caro Wladimir, não sei qual a sua “Bronca” com Zidane, mas imagino que certamente tenha algo a ver com o fato de o francês ter destruido a seleção brasileira duas vezes em copa do mundo e jamais, mesmo em amistosos, ter sido derrotado pela amarelinha.

    compará-lo a adolf hitler extrapola os limites do bom senso. primeiro porque você o está analisando por um ato isolado, e segundo porque ele foi apenas um esportista, e não um comandante de exército em plena guerra.

    mas o mais engraçado é que se Zidane é “um mau-caráter que dá cabeçadas em seus colegas de trabalho”, o que seria o Sr. Pelé, então? O cara QUEBROU A PERNA DE DOIS ADVERSÁRIOS – Kiesman, alemão, em amistoso no Maracanã em 1963, e Procópio, brasileiro, em jogo da Taça Brasil de 1965 – além de ter dado aquela cotovelada extremamente maldosa no fontes, na semifinal da copa de 70. lembremos que zidane só foi expulso por conta da televisão, recurso que na época de pelé não havia. o que seria da seleção brasileira, então, com 1 a 0 para o uruguai no placar e pelé expulso?

    se zidane é um mau-caráter, o que você pensa sobre Ronaldo fenômeno, expulso por dar uma cotovelada no zagueiro Ayala, em 1999, quando jogava na Itália? e de romário, um jogador que agride torcedores, e colegas de equipe?

    Citarei somente esses três nomes.

    E Zidane, em termos de conquistas, fez até mais que Graham Hill, um piloto que admiro e respeito demasiadamente.

    Abraços!

  3. wladimir disse:

    Incluir a lenda Graham Hill no mesmo parágrafo que um futebolista patético que se vangloria de uma conquista de copa do mundo (1998) em que a outra seleção parecia uma tropa de mortos-vivos? É uma injustiça a um grande piloto cuja versatilidade o torna o único vencedor da tríplice coroa, o único piloto que fez um filho que também foi campeão de f1. Um cavalheiro como Hill comparado a um mau-caráter que dá cabeçadas em seus colegas de trabalho??? Daqui a pouco vão endeusar Adolf Hitler porque ele autorizou o patrocínio para a criação das equipes de corrida Mercedes e Auto Union!!!

    • ballista disse:

      Caro Wladmir, sua birra parece muito mais ligada ao fato de o Brasil ter perdido a copa de 98 do que propriamente às qualidades de Zidane como jogador. Deixe de ser recalcado e procure se informar mais sobre a carreira de Zidane. Se sua referência é o futebol brasileiro, procure os melhores momentos da partida entre Brasil e França na copa de 2006 e entenda o que é um jogador com classe e técnica dentro de campo.

      Sem mais!!

      Ballista

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