Correr para Vencer

Do Japão para 2013.
05/10/2012
Trilegal
10/10/2012

Vitórias em excesso, tanto quanto as derrotas – perguntem a Michael Schumacher – não satisfazem os instintos de quem é movido a desafios.

Depois de uma semana tão importante no que se refere a movimentações de bastidores, o GP do Japão teria de se esforçar muito para gerar manchetes concorrentes. E o fez, do jeito mais cinematográfico possível: com uma batida envolvendo o líder do mundial, logo na 1ª curva.

Se pararmos para pensar, tudo remete à rodada de Räikkönen na Spoon, na parte final da qualificação. Graças a ela, ou mais precisamente à bandeira amarela dela decorrente, Alonso não teve meios de melhorar seu tempo e mais uma vez teve que arriscar o pescoço no funil dos jovens leões. Sofreu apenas dois abandonos em toda a temporada, e nas duas vezes por culpa de acidentes de largada.

Em Suzuka, no entanto, Fernando não pode reclamar de ninguém. Foi espremido sim, mas reagiu de forma exagerada e acabou tocando ele próprio a Lotus de… Kimi Räikkönen. É o que podemos chamar de caminhos cruzados.

Quanto a Hamilton, é verdade que ele também foi prejudicado pela rodada do finlandês, mas em seu caso o resultado foi muito menos definitivo. Mais uma vez o campeão de 2008 fez uso do rádio para jogar no ventilador suas insatisfações para com o acerto fino de seu bólido, desta vez materializada numa tendência subesterçante. Análises sérias dentro da imprensa inglesa sugerem que esta falta de autonomia em relação a estratégias e opções de setup teria sido fator decisivo para a opção do piloto em relação à Mercedes. Tendo sido adotado ainda moleque pela turma da McLaren, Lewis teria muitas dificuldades para conseguir ser visto como alguém que cresceu e já pode tomar as próprias decisões.

Sua atitude, no entanto, de revelar pelo twitter dados da telemetria referentes ao GP da Bélgica, esvaziando-se de culpa pela eventual falta de desempenho, conseguiu no máximo provar que os dois lados tinham razão.

Duas vitórias seguidas, no momento decisivo do campeonato. Alguém poderia dizer que, como parte de sua preparação psicológica, Sebastian Vettel passou a ler todos os dias a mais recente coluna de nosso amigo Manuel Blanco.

Brincadeiras à parte, Vettel tem se revelado o grande senhor de Suzuka, e essa tem de ser uma credencial a ser respeitada, dado o pedigree do local. Uma pista fabulosa, de acerto dificílimo, que sempre soube separar os homens dos meninos. Como se não bastasse, ao vencer pela 3ª vez em 4 anos, Seb deixou para trás Nelson Piquet e igualou os 24 triunfos de Juan Manuel Fangio.

Se é verdade que Vettel tem lá suas fragilidades, é igualmente justo afirmar que tanto ele quanto Alonso, por razões distintas, merecem frequentar o seletíssimo clube dos tricampeões mundiais.

Ou alguém ainda aposta que o campeão sai de outro lugar?

Evolução de pontos 15º Etapa

Correr para vencer. Quanto tempo faz que Felipe Massa não sabia o que era isso?
Não vou aqui tentar mais uma vez entender as razões que transformaram o Felipe Massa brigador, de meados de 2007 a meados de 2009, no piloto zumbi de tempos recentes.

Simplesmente são muitas as variáveis para que se possa fazer uma análise mais conclusiva. No entanto, foi bastante esclarecedor ver a forma como Felipe se portou diante da possibilidade de brigar pela vitória. Largada excelente – como tem sido hábito, justiça seja feita –, ritmo forte, e muito cuidado com os pneus.
Não fosse pela cochilada de Kobayashi após a saída do safety car, e do tempo perdido atrás do japonês e de Jenson Button, Felipe poderia até ter tentado alguma pressão sobre Vettel nos momentos iniciais. Mas, claro, para isso teria que estar se classificado melhor. De qualquer forma, a renovação de contrato parece agora encaminhada por mais um ano. É esperar pra ver.

Palavras rápidas sobre a dupla da Sauber.

Kamui Kobayashi fez corrida excelente, explorando os atalhos de sua manhosa pista caseira, e lidando muito bem com a pressão de guiar diante da torcida. Pódio merecido, que fez lembrar o já distante GP na mesma Suzuka em 1990, no qual Aguri Suzuki testemunhou a última dobradinha com pilotos brasileiros.

Quem poderia imaginar, naquela altura, que demoraria menos tempo para outro japonês subir num pódio caseiro, do que para o Brasil repetir um resultado 1-2?

Quanto a Sergio Pérez, o acerto com a McLaren visivelmente o empolgou. Primeiro, partiu em perseguição a Lewis Hamilton, mergulhando sem aviso pela parte interna do hairpin, numa ultrapassagem à moda antiga. Maravilha. E depois, sentindo-se o mais novo fenômeno no automobilismo mundial, perdeu o respeito e tentou a mesma manobra, em cima do mesmo piloto, só que pela linha externa. Colocou roda na grama, freou sem qualquer equilíbrio, e foi parar na caixa de brita.

Voltou à realidade. (Aliás, esporte cruel este automobilismo. No futebol ou no tênis, o atleta isola a bola, faz cara feia, e jogo que segue. Na F1, basta se empolgar um pouco para ficar de fora da disputa)

E então, as corridas que faltam devem favorecer a quais conjuntos?

Deixo a resposta para os leitores, e estou curioso para ler as opiniões. Certo mesmo é que a Ferrari encontrou um péssimo momento para desligar seu túnel de vento, que aparentemente continua descalibrado e gerando divergências.

Sem qualquer vantagem para administrar, Alonso já não pode mais se contentar em pontuar com regularidade. Se a equipe italiana quiser levar até o fim uma campanha que figura entre as melhores em todos os tempos, então precisa pensar em vitórias e pódios. E, como semana que vem já tem corrida, essa vai ter que ser no braço mesmo.

Eleições no Brasil, eleição na Venezuela.

Se surgem os primeiros sinais de que muita gente no Caribe começa a querer ver Chávez pelas costas, uma coisa é líquida e certa: Pastor Maldonado deve ter dormido mal esta noite, na expectativa da reeleição de seu maior incentivador. Agora, com o resultado divulgado, também ele deve estar com lugar garantido no grid em 2013.

E então Schumacher vai se aposentar. De novo.

Considerando a totalidade de sua carreira, os elogios devidos já foram escritos lá atrás, em 2006. Em sua segunda passagem, Michael acrescentou muito pouco à sua biografia no que se refere a notícias, e todo um universo no que tangencia as análises. Mas estas podem, e devem, esperar até o fim do ano.

Sob todos os aspectos, sua ida definitiva se mostra uma notícia muito menor do que a de seu retorno, três anos atrás, dando a dimensão exata de que as metas não foram atingidas. Ainda assim, o esporte deixa de contar com a presença de um de seus maiores atores em todos os tempos, e certamente perde um atrativo que ainda era capaz de levar muitas pessoas aos autódromos.

Interlagos, aliás, já tem garantido mais um dia histórico em sua vida.

Mas o grande adeus da semana mesmo foi o de Sébastien Loeb.

Forte candidato ao título de maior piloto em todos os tempos, de qualquer categoria já inventada, Loeb conquistou neste fim de semana nada menos que o 9º (!!!!!!) título consecutivo (!!!!!) no campeonato mundial de rali. E, pouco antes disso, anunciou que não irá competir no ano que vem, e que daqui por diante deve fazer apenas aparições esporádicas no campeonato que monopolizou por uma década inteira.

Muito mais que os números absurdos, é nos detalhes que a carreira de Loeb o credencia a um lugar tão elevado quanto o e Fangio no Olimpo do esporte a motor. Três vezes vencedor da Corrida dos Campeões, com atuações soberbas em qualquer tipo de carro e em qualquer piso; vice-campeão em Le Mans correndo com equipamento inferior e sendo o melhor piloto de sua experiente equipe (palavras de Ricardo Divila); vencedor dos X-Games na única vez em que participou do evento; reverenciado quase com idolatria pelos próprios adversários… Enfim, Loeb é um monstro, dono de uma reserva técnica assustadora, e uma intuição a respeito de onde se encontra a aderência que lembra em muito Ayrton Senna.

Uma pena que, por razões opostas às de Felipe Massa, Loeb também tenha perdido o gosto do que é correr para vencer. Vitórias em excesso, tanto quanto as derrotas – perguntem a Michael Schumacher – não satisfazem os instintos de quem é movido a desafios. Agora, só nos resta desejar que, num palco qualquer por aí, Seb encontre algo capaz de motivá-lo a continuar exibindo o imenso talento que Deus lhe deu.

Uma ótima semana a todos.

Márcio Madeira

Márcio Madeira
Márcio Madeira
Jornalista, nasceu no exato momento em que Nelson Piquet entrava pela primeira vez em um F-1. Sempre foi um apaixonado por carros e corridas.

3 Comments

  1. Lucas Giavoni disse:

    Excelente texto, amigão.

    Você mencionou Loeb nos X-Games. O cara enfrentou macacos-velhos no assunto como Ken Block e Travis Pastrana, que acabaram comeram poeira dele. Esse francês realmente me assusta.

    Resta torcer para que a Citroën de fato monte uma equipe no WTCC. Apenas para ele correr.

    Abração!

  2. Fernando Marques disse:

    A vitoria do Vettel e o abandono do Alonso abriu novas perspectivas em relação ao titulo de campeão de 2012 … o campeonato que parecia seguir em passos certos em direção ao Alonoso pode ter mudado de rumo …
    MArcio, penso que a Ferrari deu uma estagnada preocupante neste momento e coloca em risco o titulo do Alonso em 2012. Daqui para frente se não tiver melhoras signficantes vai comer poeira das RBR do Vettel. Isso sem falar que este abandono do ALonso em Susuka pode representar uma injeção de animo para Hamilton …
    É impressionante como o desempenho do MAssa melhora quando o Alonso não está na pista … por que será? … hein!!! … hehehehehehe

    Fernando Marques
    Niterói RJ

    • Manuel disse:

      Certo, caro amigo !

      Nao me surpreendería se houvesse alguma petiçao de esclarecimento de alguma coisa nos carros da Red Bull. Estes havian sofrido muito com a proibiçao dos difusores soprados, mas… agora estao de volta, enquanto que os outros, principalmente a Ferrari, nao avançam.

      Curioso como os dois abandonos de Alonso tenham sido causados pela Lotus-Renault, a fornecedora dos motores da Red Bull.

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