Estudo aponta

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Nestes tempos obscuros que estamos vivendo, somos torpedeados com as mais diversas pesquisas e estudos científicos que revelam, apontam ou (tentam) comprovam alguma coisa: use máscara, mas não sempre, fique em casa, mas saia, não ingira alimentos assim, mas pode fazê-lo se preferir. Aguarde alguns dias se tiver sintomas. Nada disso, vá correndo pro hospital. Se for idoso ou tiver problemas crônicos não pode, mas na verdade ninguém pode, e todo mundo pode, também. Cloroquina. Azitromicina. Ivermectina. Pode? Só para casos graves. Não, melhor como preventivo. Tem uma vacina, mas há uma outra. Esta teve algumas reações, aquela tem outros tipos de problemas. Há uma terceira, e uma quarta ainda não foi confirmada. Talvez a quinta. Epicentro, segunda onda, distanciamento, isolamento, cuidados, higiene, álcool gel. Igrejas não, academias sim. Mercado com restrições. Comércio fechado, liberado, restrito. Quem já foi contaminado, não pega de volta. Mas talvez possa contrair, sim.

Mil possibilidades, mil teorias. Poucas respostas. Nenhuma definitiva.

Em meio a tantos estudos relacionados à Covid-19, aparece um da Fórmula 1. Todos vocês devem ter visto: “Senna é apontado como piloto mais rápido da F1 nas últimas 4 décadas”. Desde 1983, para ser mais preciso. O original, promovido pela própria F1, está aqui.

O top3 (ou pódio), foi bastante coerente com o que se esperaria: Senna, Schumacher e Hamilton. Alguém poderia discordar da ordem (e certamente todos os mencionados seriam dignos), mas até pelo número massivo de poles — os únicos na história com 60+ — não parece haver espaço para mais um. O quarto lugar vem com Max Verstappen, que de fato vem impressionando (está num período, já desde 2016, semelhante à fase de Senna na Lotus, considerando-se o déficit de equipamento com relação às Mercedes), a ponto de Jenson Button, e outros, já terem apontado-no como o mais próximo de Senna ou mesmo o mais rápido da história. Alonso vem em quinto e, apesar do número relativamente baixo de poles, sempre foi um piloto muito constante e eventual candidato às primeiras filas.

Mas a partir daí a coisa vai se tornando complicada: Trulli e Kovalainen entre os 10, Prost atrás de Fisichela (apenas em vigésimo), Felipe Massa (bem) à frente de Nelson Piquet, entre outras coisas aparentemente inexplicáveis. O depoimento de Ross Brawn procura dar uma explicação aparentemente lógica para o caso, mesmo dizendo que não se trata de algo definitivo: “Jarno Trulli podia ser extremamente rápido numa volta lançada, mas não conseguia manter o ritmo por mais de 5 voltas“.

De fato, a maior confusão quanto a este ranking parece ser que o propósito não foi entendido ou acatado: tratava-se de apontar o mais rápido em volta de classificação, usando-se como base o que de fato produziram, e não o que poderiam produzir ou o que teriam produzido caso as condições fossem rigorosamente idênticas a todos. Não se trata das somas de habilidades, e sim de uma habilidade em específico.

Me parece que este seja o cerne da questão do tal estudo e as reclamações e críticas a ele. É claro que sempre haverá quem “não leia e não goste” (houve quem criticasse a GLOBO por conta da matéria, acreditando que seria uma pesquisa encomendada pela emissora, acreditem!). Esses, mais confundem do que contribuem.

Embora polêmico e muito comentado, este não foi o primeiro estudo de grandes proporções usando algoritmos.

À época falou-se muito (e quem assistiu o belíssimo documentário do argentino no Netflix viu mais sobre isso), e um estudo também se usando cálculos científicos — baseados nos resultados factuais, e não hipotéticos — colocou Fangio como o melhor de todos os tempos. Os principais nomes, lá em cima, tudo bem. Mas aí você vê Christian Fittipaldi em 12º, Nick Heidfeld à frente de Stirling Moss e Jack Brabham, e Niki Lauda (bem) longe dos principais. O tal estudo procurava eliminar o fator carro quando prejudicial (quebras mecânicas, elétricas etc).

O estudo atual (dos mais rápidos), pois, se baseia também em premissas como disputas internas, e porventura as colocações no grid, diferenças médias para seus companheiros de equipe, posição média de largada etc. É bom lembrar que Senna, somadas suas posições de largadas e dividindo-as pelo número de corridas, tem-se o coeficiente 3.15, o terceiro da história (Fangio, primeiro, com 1,78, Farina segundo, com 3,12), mas Senna o fez disputando mais de uma centena de corridas acima do total dos primeiros colocados, sem contar que enfrentou muito mais diversidade (pra baixo) de equipamento no comparativo com ambos — foram 15 corridas com Toleman, 32 no período contra as Williams Renault etc.

Por mais que haja contradições e que muitas vezes a própria OMS “volte atrás”, parece-me óbvio que o uso de máscara e o isolamento social, por mais doloridos e incômodos que possam ser, são as medidas mais efetivas para que não nos contaminemos. Igualmente lógico é apontar Senna como o mais rápido em uma volta lançada dentre todos os pilotos que passaram pela F1.

Não seria preciso realizar nenhum estudo para apontar tais resultados.

Abraços,
Marcel Pilatti

***
Leia também:
[1] A última obra-prima de Ayrton Senna
[2] O grande recorde de Senna
[3]
Memória resgatada

Marcel Pilatti
Marcel Pilatti
Chegou a cursar jornalismo, mas é formado em Letras. Sua primeira lembrança na F1 é o GP do Japão de 1990.

5 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Estes estudos comparativos são tudo balela … a Formula 1 de uma década para outra, desde a sua existência, sempre sofreu grandes alterações seja na area tecnologica, aerodinamica, de motores e de pneus … e isso sempre influenciou na forma de se pilotar os carros … dou como exemplo o próprio Senna, que teve na Mclaren um carro resistente e veloz … se ele surgisse nos anos 70 não terminaria 80% da corridas dado a fragilidade dos carros naquela época … Jim Clarck teria no minimo o dobro de vitorias que teve na carreira se tivesse um carro como Senna teve no final dos anos 80 …então não costumo a dar crédito a estes estudos comparativos que tanto o pessoal fazem …

    Fernando Marques

    Niterói RJ

  2. MarcioD disse:

    Os 3 primeiros são incontestáveis, só inverteria a ordem entre Hamilton e Schumi. Max não é isto tudo não.

    O que estranhei é que analisando do ponto de vista das décadas onde os top 20 do ranking começaram a competir, temos que somente 2 iniciaram nos anos 80, 4 nos anos 90, 7 nos anos 2000 e 7 nos anos 2010. Sendo que dos de 2000, 2 estão no grid atual e dos de 2010 são 6 perfazendo um total de 8 ou 40% do grid atual. Se considerarmos a volta de Alonso em 2021 serão 45%. Ou seja 45% do grid a partir de 2021 estarão no top 20 do tal ranking.

    Será que os pilotos de 2000/2010 são tão mais rápidos assim a ponto de responderem por 70% dos 20 primeiros do ranking? Duvido. Pareceu-me mais uma jogada de Marketing da FIA/ Liberty para promover o grid atual em tempos de pandemia.

  3. Rodrigo disse:

    Confesso que não vi tanto motivo pra torcer o nariz. É sobre ser rápido, e ser rápido é apenas UM dos requisitos necessários para se ser um campeão – ou um bom piloto, que seja. Prost e Piquet lá embaixo? E desde quando ambos são definidos primariamente como velozes? Eles foram grandes por serem genialmente constantes. De que adiantava o Trulli voar nas dez primeiras voltas e sair na décima-primeira? Prost sentava, esperava, e assim obteve um caminhão de vitórias, recorde que o veloz.

    Falta muita gente – pré 80s, como Fangio, Clark, Farina, Moss e quem sabe até doidos-varridos como Villeneuve. O ranking, dadas as premissas, foi até bem óbvio.

  4. Bslnew disse:

    Muita gente criticando, mas o estudo tem suas bases e premissas. Assim, antes melhor seria estudar essas premissas e entendê-las melhor, para ai sim, sobre elas, tecer suas críticas. Como bem lembrado, o estudo tem como base voltas na classificação, e apenas de 1983 para cá. Então não teremos Fangio e Clark.

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