Viva Rubinho!

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Sempre houve uma espécie de maldição a pesar sobre Rubinho, a mesma que pesa sobre o garoto-personagem do filme A.I.: você terá vida longa para sonhar mas não poderá, nunca, ver o seu sonho se concretizar.

 

Os olhos de Rubinho ainda traem o espírito do menino inocente que, catorze anos atrás, se considerou herdeiro presuntivo de Ayrton Senna apenas porque ouviu falar disso na TV.

Sendo e querendo – quem não quer? – continuar menino, não soube ou não quis contextualizar a opinião da TV, que lhe chegava embalada em um misto de ufanismo barato e interesses comerciais. Não é surpreendente que a TV projete fantasias; o problema é acreditar nelas além de um certo limite.

Como por trás dos olhos do menino não havia o choque quase patológico de tensões que empurrava Senna para a vitória, Rubinho se deixou levar pelo sonho de que já era campeão e só restava ao mundo curvar-se aos seus pés. Começava, assim, uma trajetória de algumas vitórias notáveis, numerosas derrotas, muitas explicações e o constrangimento de estar sempre tendo de se justificar, sempre tendo de se auto-elogiar

O mais incrível é que o sonho de Rubinho resistiu e renovou-se ano após ano, em grande parte porque vivemos tempos em que se acredita possível materializar sonhos pela simples força da repetição. Mas houve, sempre houve, uma espécie de punição a contrabalançar a continuidade do sonho, como se uma maldição pesasse sobre Rubinho como pesa sobre o garoto-personagem do filme A.I.: você terá vida longa para sonhar mas não poderá, nunca, ver o seu sonho se concretizar.

Nos anos Jordan – 93 a 96 -, a relativa facilidade para arregimentar patrocinadores brasileiros, mais a pressão dos organizadores por um brasileiro no grid e a falta de opções melhores acabou preservando o lugar de Rubinho na categoria.

Em 97, quando tudo conduzia a um desfecho melancólico, o sonho se renovou, graças ao surgimento da equipe Stewart, que tratou Rubinho como um novato promissor. Alguns resultados foram conseguidos mas a maldição falou mais alto e ele não pode dar à equipe a sua única vitória na categoria, em Nurburgring 99, glória reservada a Johnny Herbert.

No final desta temporada, o sonho e a maldição alcançam seu ápice: Rubinho é contratado pela Ferrari – mas ele terá de conviver com Michael Schumacher.

O brasileiro alimentou com fervor, inclusive publicamente, a ilusão de que poderia bater o alemão na luta pelo título correndo em condições iguais. Nunca pode, apesar de jamais ter tido, de parte da equipe, um carro diferente do do rival. Restou a Rubinho criar a fantasia de que a equipe não lhe dava as condições de que precisava. Suponho que o que Rubinho queria eram privilégios e proteção. Li em algum lugar que o carro particular que lhe era cedido pela Ferrari não estava equipado com um similar italiano ao Sem Parar, forçando-o a parar nos pedágios, enquanto Schumacher podia ir em frente…

Será que foi isso o que faltou a Rubinho? Foi isso que deu a ele um papel comparativamente tão modesto nas conquistas da Ferrari no quinquênio 2000-2004, o mais extraordinário de uma hegemonia jamais vista na Fórmula 1?

Claro que o brasileirinho, como ele próprio se definiu, teve vitórias importantes, como na Alemanha 2000 e Inglaterra 2003, corridas eletrizantes, principalmente a última, em que bateu de forma inapelável o companheiro de equipe e quem mais ousasse desafia-lo. Mas não se pode fechar os olhos para outras vitórias das quais ele tem bem pouco do que se orgulhar, como Hungria e Indy 2002. Será que este estímulo que lhe foi dado pela Ferrari e por Schumacher não contam?

Sobre Áustria 2002, não me alinho a muitos leitores e colegas e não reconheço “culpa” de Rubinho em ceder a vitória a Schumacher, pois automobilismo é um esporte de equipe. Considero que a equipe agiu certo e Rubinho agiu mal, dramatizando daquela forma a entrega da posição a Schumacher. E penso também que só o alemão podia ter revertido a situação, se recusando a assumir a liderança.

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E de novo o sonho se renovou quando Rubinho resolveu abandonar a Ferrari, no final de 2005, antes que fosse abandonado por ela. Verdade que incorreu no pecado de abrir mão de ter o melhor carro, mas o contrato mais do que generoso com a Honda lhe deu dinheiro e sossego para cultivar o recorde de participações que ele atingiu no GP da Turquia de 2008, na sua forma peculiar de conta-las.

É um recorde justo, importante, notável mas certamente não era o recorde com que ele sonhou e provavelmente continuará a sonhar até o fim da vida.

Ainda assim, viva Rubinho!

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Esta coluna foi publicado originalmente em 11/5/08, quando Rubinho atingiu o seu recorde de participações na Fórmula 1. Nada mais parecia possível a ele mas – incrível! – a maldição a que aludi encontrou espaço para se repetir.

Rubinho implorou por uma vaga na BrawnGP, nascida das cinzas da Honda. Dizem até que ele alugou um trailer e mudou-se para a porta da equipe, na Inglaterra, nos dias anteriores à definição da equipe.

Ele conseguiu a vaga apenas para ver de perto ao maior milagre da história da Fórmula 1 – e não poder usufruir dele além de um limite muito estreito. No final da temporada, em meio a mais explicações e auto-elogios, ele terminou em 3º no Mundial de Pilotos enquanto seu companheiro de equipe, Jenson Button, festeja a conquista do Mundial de Pilotos.

No ano seguinte, Rubinho conseguiu uma vaga na Williams, já em forte decadência. Desta vez, não houve milagre, apenas a dura realidade das posições no fundo do grid.

Mas, ainda assim, viva Rubinho!

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A partir da sexta-feira, estão de volta ao GPTotal as colunas inéditas.

Abraços

Eduardo Correa

Eduardo Correa
Eduardo Correa
Jornalista, autor do livro "Fórmula 1, Pela Glória e Pela Pátria", acompanha a categoria desde 1968

6 Comments

  1. Marcelo disse:

    Temos que nos orgulhar do Rubinho. O cara correu mais do que qualquer outro piloto no mundo. Ninguém teve tanta confiabilidade na categoria top do automobilismo mundial. Longevidade é o quê todo mundo quer para fazer o quê mais ama e ele tem isso, e tomara que corra na Indy, no DTM, em Le Mans, no Rally Dacar, na Stock Car até ser expulso de lá com 120 anos!

  2. Tabajara Aparecido Jorge disse:

    Rubinho, você nunca estará sozinho porque estaremos juntos com você onde estiver.
    Tabajara
    São Carlos – SP

  3. Rangel disse:

    Schumacher é muito melhor piloto do que o Rubens, não há como questionar isso. Mas daí a dizer que os dois tinham carros idênticos na Ferrari vai uma distância muito, mas muito grande… Na minha opinião, Rubens tem dois pecados: a boca grande demais e ter nascido brasileiro. Se fosse, digamos, chileno, haveriam estátuas dele Santiago afora. 🙂

  4. Carlos Pereira disse:

    Edu, concordo em cada palavra que você disse, expressando de maneira em palavra, o que sepre achei do Rubens Barrichello. Apenas acresentaria, que na Austria 2002, ele foi o melhor em todo o fim de semana, tantos nos treinos como na corrida. Mostrou que tinha sim, e tem, muito valor na F1, ou em qualquer outra categoria que correr.

  5. Fabiano Vasconcelos Borges disse:

    pra mim o rubinho se aposentou tarde demais ele tinha q ter se aposentado qdo a honda quebrou

  6. Fernando Marques disse:

    Eu ainda acho que a opinião mais correta sobre Rubens Barrichello partiu de Nelson Piquet quando Rubinho ainda em inicio de carreira não quis ir para a Mclaren e ser o 2º piloto da equipe para continuar sendo o 1º da Jordan ou ser 1º piloto da Stewart. Piquet disse que Rubinho não estava sabendo administrar a sua carreira fora das pistas. Que no lugar dele não pensaria 2 vezes para ser 2º piloto da Mclaren e ganhar menos dinheiro naquele momento mas ter um carro que proporcionasse andar sempre na frente, algo que jamais a Jordan e/ou Stewart lhe permitiram com constancia apesar de ter tido mais vantagem financeira.
    A maior prova de que Piquet estava certo foi Rubinho mais a frente ter assinado com a Ferrari para ser escudeiro do Schumacher.
    Sendo lá o que for, de alguma forma Rubinho se eternizou como um dos maiores nomes da Formula 1, não como campeão, mas como recordista de longetividade na categoria …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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