Um piloto burocrático? Não é difícil definir assim Dennny Hulme, campeão da temporada 67 da Fórmula 1. Afinal, ele marcou apenas uma pole em toda a carreira – África do Sul 73 –, oito vitórias em GPs e nove voltas mais rápidas.
Mas olhe um pouco mais: em nove temporadas completas na F1 (em 65, ano da sua estreia, disputou metade das provas), terminou à frente do companheiro de equipe cinco vezes, inclusive batendo os donos das equipes para as quais corria em 67 e 68. Em paralelo, terminou duas vezes a Indy 500 em 4º lugar – em 67, ano de estreia na prova, e 68 –, ganhou as 24 Horas de Le Mans em sua categoria na edição de 61 e só não ganhou em 66 – quando dividiu um Ford GT 40 com Ken Miles – por conta da decisão esdrúxula da edição da prova, tendo de se contentar com o 2º lugar. Ah, sim: conquistou os títulos de 68 e 70 do CanAm e nada menos do que 22 vitórias na categoria. E o mais importante: sobreviveu a um dos períodos mais violentos da história do automobilismo, vendo mais de uma dezena de colegas perecerem nas pistas, inclusive o seu amigo mais próximo, Bruce McLaren.
Não, Hulme não era um piloto burocrático. Ele era corajoso, dedicado, eficiente e discreto, muito discreto, a ponto de ser taxado de taciturno pelos seus próximos, a ponto de merecer o apelido de “O Urso”.
A seguir, em homenagem a Hulme – e retomando a minha série Foto-Legendas – alinho imagens de alguns dos F1 pilotados por Hulme
1965
Nascido em 1936, na Nova Zelândia, onde iniciou sua carreira como piloto enquanto trabalhava com o pai, Hulme foi para a Europa em 60, graças a um prêmio recebido da – acredite se quiser – Associação Neozelandesa de Grand Prix, a mesma que tornou possível a carreira de Bruce McLaren.
Chegando à Inglaterra, Hulme obteve algum sucesso em fórmulas de ingresso e um emprego como mecânico na equipe Brabham. Conquistou gradualmente a confiança de seu chefe, inicialmente correndo pela equipe em fórmulas menores enquanto trabalhava nas oficinas, até estrear no Mundial de F1 pela Brabham, depois de disputar três provas extraoficiais na categoria, uma delas pela própria equipe, em 63.
A equipe Brabham havia começado timidamente na categoria em 62, aprendendo rápido: ano seguinte termina o Mundial de Construtores em 3º, seus carros pilotados por Jack Brabham e Dan Gurney. Em 64, conquista a sua primeira vitória em GP, na França, graças a Gurney, e passa a construir carros para outras equipes. No GP da Inglaterra, por exemplo, sete Brabhams alinham para a largada, inscritos por seis equipes diferentes.
Em 65, Hulme corre ao lado de Jack e Gurney, revezando-se com eles, em alguns GPs largando o três. A primeira corrida de Hulme se dá em Mônaco, onde ele faz uma corrida discreta: 8º no grid, 8º na bandeirada. Salta o GP seguinte e está de volta na França (foto acima), onde larga em 6º e termina em 4º, ao final de uma corrida de recuperação, pois caiu para 14º no final da primeira volta. Faz mais quatro GPs no ano; abandona em três deles e termina em 5º na Holanda.
1966
Em 66, Hulme assume em tempo integral a pilotagem de um dos Brabham oficiais, ao lado do dono da equipe. É o ano da mudança de regulamento, iniciando a gloriosa fase dos motores de três litros aspirados.
Graças à parceria com o fornecedor Repco, a equipe Brabham se sobressai em meio ao despreparo das demais equipes. Jack se sagra campeão, emendando quatro vitórias seguidas no meio da temporada. Hulme termina o ano em 4º no Mundial de Pilotos, graças a quatro pódios – um 2º lugar na Inglaterra e três 3ºs, França (disputado em Reims, foto acima), Monza e México. Nas demais provas, abandona.
1967
Hulme faz o impensável: torna-se campeão do mundo, pontuando em nove das onze etapas, conquistando vitórias em Mônaco (segunda prova do ano, a partir da qual assume a liderança do Mundial para não mais perdê-la) e Nurburgring, e colecionando pódios em todas as demais etapas em que terminou, menos uma.
Hulme beneficia-se da fraqueza geral dos adversários e da demora de Jack em acertar-se com o carro; nas quatro primeiras provas do ano, ele marca apenas um 6º e um 2º lugares. No final do ano, de forma amigável, Hulme deixa a equipe e passa a competir pela McLaren, atraído tanto pela proximidade com Bruce quanto por um salário certamente maior. Na foto acima, Hulme e seu Brabham em Silverstone, onde terminou em 2º.
1968
Na nova equipe, o neozelandês segue competitivo e só sai da disputa pelo título na prova final, GP do México, quando tem problemas com o freio do seu carro. Venceu em Monza e no Canadá e pontua em outros cinco GPs, terminando em 3º no Mundial de Pilotos, bem à frente de Bruce. Na foto acima, Hulme e seu McLaren em Watkins Glen, onde abandonou por acidente.
1969
Os pneus Goodyear fazem a diferença na temporada, mas não para a McLaren. Hulme é 6º no Mundial de Pilotos, seis pontos atrás de Bruce. Em compensação, Hulme consegue a única vitória da equipe no ano, no GP do México (foto acima), depois de seis abandonos seguidos.
1970
A equipe McLaren sofre o impacto da morte de Bruce, em Goodwood, ao testar um carro de CanAm. Hulme se torna central para a sobrevivência da equipe, terminando o ano em 4º no Mundial de Pilotos, sem vitórias, mas com quatro pódios. O carro da equipe deveria ser osso duro, porque os substitutos de Bruce – Gurney, Peter Gethin e Andrea de Adamich – mal consegue terminar as corridas.
No meio do ano, ao testar um Fórmula Indy de construção da McLaren, Hulme sofre um acidente, queimando-se gravemente. Poucas semanas depois, estava de volta às pistas, terminando em 3º em Mosport, numa prova de CanAm, prendendo a mão queimada ao volante com esparadrapo. Em sua volta à F1, terminou em 4º lugar no GP da França. Na foto acima, Hulme no GP da Áustria, onde abandonou por quebra de motor.
1971
Um péssimo ano para a McLaren, conquistando só dez pontos entre os Construtores, 6ª entre nove equipes do Mundial, a mesma coisa para a Hulme, nove pontos somados, apenas 13º no Mundial de Pilotos. Na foto acima, a caminho do 4º lugar no GP de Mônaco.
1972
Hulme e a McLaren reagem. Com o patrocínio da Yardley, a equipe volta a ser protagonista. Hulme só fica atrás de Emerson Fittipaldi e Jackie Stewart no Mundial de Pilotos, tendo conseguido o 2º lugar na Argentina e a vitória na África do Sul, duas primeiras corridas do ano, além de mais cinco pódios. Graças a este desempenho, a equipe termina o ano em 3º no Mundial de Construtores. Na foto, Hulme em Brands Hatch, onde terminou em 5º.
1973
Hulme, aos 37 anos, estaria cansado de correr em círculos? Talvez… Apesar de contar com o magnifico McLaren M23, disponível a partir da terceira corrida da temporada, conta poucos pontos – nas últimas oito GPs da temporada, soma apenas sete pontos –, mas conquista a vitória na Suécia, a primeira do histórico carro. Na foto acima, em Mônaco, onde termina em 6º.
1974
Se estava cansado, Hulme disfarçou ao que pode. Abriu a temporada 74 simplesmente vencendo na Argentina – ele atribuiu a vitória à sorte, tendo assumido a liderança da prova a duas voltas do final, depois de Carlos Reutemann ficar sem gasolina. Era a primeira vez que a equipe McLaren aparecia com as cores da Marlboro e tendo Emerson na equipe.
Depois da vitória, Hulme tornou-se um coadjuvante. Até o final do ano, somou apenas onze pontos, tendo de notável um 2º lugar na Áustria. Mesmo assim, terminou o ano em 7º, vendo Emerson chegar ao seu segundo Mundial e a McLaren conquistar o Mundial de Construtores.
Em seu último GP, nos Estados Unidos (foto que abre esta coluna), larga em 17º e abandona depois de quatro voltas, alegando quebra do motor. Era a sua despedida da categoria. Na foto logo acima, ele aparece protegendo-se do sol em Interlagos.
Hulme voltou para a Nova Zelândia, dedicando-se às corridas locais e na Austrália, inclusive de caminhão. Morreu ao volante de um BMW por ataque cardíaco enquanto disputava a Australia’s Bathurst 1000. Tinha apenas 56 anos.
Abraços
Edu
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1 Comments
Edu,
“Fotos Legendas Dennis Hulme” simplesmente é mais um deleite … contar a história de pilotos dessa forma é sensacional …
Me lembro, quando novo, gostar muito de assistir o Hulme correndo … afinal era um campeão mundial nas pistas.
Fernando Marques
Niterói rj