A palmada que não veio -Parte 3

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Continuamos a história dos bastidores que existiam nas temporadas que sucederam a chegada de Ayrton Senna a McLaren e o ambiente que Alain Prost criou, leiam a primeira e a segunda partes clicando nos links

A palmada que não veio – Parte 1

A palmada que não veio – Parte 2

Deste modo, Prost foi muito inteligente ao apresentar tudo como uma traição, pois a primeira versão sempre é a que causa mais impacto no publico, deixando a outra parte com a única opção de desmentir essa versão, mas com a sua credibilidade posta em dúvida. Assim, um desmentido pode não resultar convincente e sempre tem uma menor repercussão. Como sabemos o autor de uma má ação não costuma admiti-la, portanto o desmentido pode até resultar contraproducente. Como diz o velho ditado: “Da calúnia alguma coisa fica !

O ambiente na equipe se tornou insuportável que Dennis convoca uma reunião com os dois para tratar de suavizar as coisas. Uma vez mais e tão logo a reunião termina, Prost foi logo contando à imprensa francesa tudo o acontecido na reunião, e dizendo que Senna era um sujeito desonesto que não cumpria a sua palavra, algo que acaba deteriorando ainda mais a relação entre ambos, pois quando Senna leu essas declarações, irritado diria que Prost o que queria é fazê-lo parecer culpável perante o publico. Apesar de que o propósito daquela reunião era suavizar as coisas entre todos, com sua incontinência verbal, Prost acabou enervando a Senna e Dennis ainda mais.

Nas seguintes dez provas, incluída a da Itália em Monza, e a partir de então dar inicio à contagem dos 11 melhores resultados, Senna venceria em cinco delas… Mas abandonaria nas outras cinco por problemas mecânicos, enquanto que Prost abandonava apenas no Canadá, conseguindo quatro vitórias, sempre aproveitando as ausências de Senna, e ocupando o segundo lugar quando Senna esteve em pista. Assim a classificação no campeonato deixava a Prost com 71 pontos, com seus onze resultados já cobertos, enquanto que Senna tinha 51 pontos, mas havendo pontuado em apenas seis provas.

As insinuações de Prost respeito ao suposto tratamento de favor a Senna não cessavam, apesar de que fosse o brasileiro quem mais abandonos registrasse por problemas mecânicos de todo tipo. Concretamente ali em Monza, Prost persistia em sua insistência de estar sendo discriminado pela Honda, contudo foi ele quem venceu, enquanto que Senna abandonaria… Com problemas no motor. Segundo Steve Nichols, um dos projetistas do MP4/5, Senna simplesmente se adaptava melhor ao MP4/5 do que Prost, nada mais !

Anteriormente, no GP dos EE.UU. em Phoenix, Prost também havia dito que Ayrton recebia melhores motores da Honda do que ele, e esgrimia como argumento a maior velocidade do brasileiro na reta. Porem, segundo a telemetria, essa velocidade alcançada por Senna era graças a entrar na reta com o carro já lançado a maior velocidade do que Prost, devido a sair da curva também a maior velocidade do que o francês. Como aconteceria em Monza, Senna abandonaria, deixando a vitória para Prost.

Nos GPs de Portugal e Espanha, Prost consegue um segundo e um terceiro lugar respectivamente, enquanto que Senna fica fora em Portugal, ao ser abalroado por Mansell, e vence na Espanha. Com estes resultados a classificação deixa Prost com 76 pontos e Senna com 60 pontos, com dois GPs ainda por disputar. Deste modo, e para ser campeão, Senna precisava vencer nas duas ocasiões, pois Prost só podia somar mais dois pontos, o que deixaria a ambos empatados a 78 pontos, mas Senna dispunha da vantagem de contar com mais vitórias.

O primeiro desses GPs seria o do Japão, no circuito de Suzuka, propriedade da Honda e Senna, uma vez mais, domina a classificação, sendo o único piloto que baixa de 1’39” e deixando a Prost, o segundo no grid, a 1,73”, outra demonstração de que, naquele circuito, Senna se dava muito bem. Contudo, na largada, é Prost quem pula na frente e ai se manteria até a troca de pneus, deixando a liderança para Senna, quem ainda tinha de trocar os seus. Três voltas mais tarde Senna entra nos boxes para a troca e Prost recupera a ponta. Senna vinha perseguindo Prost desde o principio, mas os carros apresentavam um rendimento tão parelho que era impossível ultrapassar na reta, como o havia feito em 1988.

Assim, e como diria Senna numa entrevista concedida a nosso querido mentor Eduardo Corrêa, Senna optou por exercer pressão com a esperança de desgastar o francês à espera de encontrar algum lugar onde poder ultrapassar, e esse lugar acabaria sendo a chicane. Por sua parte, Prost diria que a sua estratégia era manter Senna o bastante perto para degradar seus pneus, de modo que nas últimas voltas já não pudesse fazer nada. Prost antes da corrida também havia dito aos quatro ventos que de nenhum jeito pensava “abrir a porta “ a Senna. “De nenhum jeito vou deixar-lhe sequer um metro de espaço. De nenhum jeito ! “ Foram as suas palavras.

Desta maneira, com Prost liderando e Senna em seu encalço, chegamos à volta 47 quando, finalmente, Prost deixaria um espaço suficiente na freada da chicane para que Senna visse a oportunidade que pacientemente esteve esperando, e se lança decidido à curva. Porem, e estando já os dois carros em paralelo, Prost gira o volante repentinamente para a direita, os dois carros colidem, as rodas se engancham e ambos acabam parados à frente da zona de escape.

Prost rapidamente sai do carro, seguro que a corrida havia acabado para os dois, mas Senna pede aos fiscais que o empurrem, consegue ligar o motor, cruza a chicane e chega aos boxes para que lhe troquem o bico danificado, voltando à pista para, numas ultimas cinco voltas apoteóticas, acabar vencendo a prova… Ou isso pensava !

Enquanto nos boxes da McLaren Senna ainda celebrava a vitória, Prost reclama ante os fiscais a manobra de Senna e, aproveitando seu bom relacionamento com Balestre, solicita deste a desclassificação do brasileiro, ainda que primeiro devessem encontrar um motivo que… Finalmente encontraram, e ainda que fosse o mais ridículo, não lhes importou !

O “terrível” motivo esgrimido foi que Senna havia cortado a chicane, sem que em nenhum momento se atribuísse a Senna má ação alguma durante o acidente. De fato, nem se mencionava o acidente que originou todo o imbróglio e obrigou Senna a cortar a tal chicane, pois segundo o regulamento, quando um piloto consegue estar em condições de voltar à pista, deve fazê-lo pelo mesmo ponto em que saiu, mas neste caso isso teria obrigado Senna a dar marcha atrás ou a entrar contramão, o que está proibido. Ademais, tampouco houve ganância de tempo no corte da chicane, pois Senna perdeu mais de dois minutos até ligar o motor, e ainda teve de perder mais tempo no Box para trocar o bico, portanto o tal “corte” não lhe proporcionou nenhuma vantagem !

Isso levou a desclassificação a um resultado ainda mais absurdo, considerando que os últimos vinte e seis pilotos que haviam sido desclassificados nos anos anteriores, em nenhum caso o foram por cortar chicane nenhuma ou encurtar a distância da corrida, como se dizia neste caso. De fato, de todos os pilotos que por algum motivo haviam feito isso (normalmente por perda de controle do carro ou acidente), nenhum foi punido… Nem o próprio Prost, que o havia feito em San Marino no principio da temporada.

A McLaren logo apresenta um recurso em contra da desclassificação, o que é visto como prova do favoritismo por Senna. No entanto e segundo Dennis, para a equipe tanto fazia que vencesse um ou outro, pois o único que lhes interessava era oferecer a vitória à Honda em sua própria casa. McLaren sustentava seus argumentos com vídeos de outros casos parecidos em que os pilotos não foram desclassificados, mas tudo foi em vão e o recurso seria desestimado, com Balestre inclusive dizendo que não havia força nem política nem legal fora da FIA que pudesse anular a sua decisão, chegando a lançar veladas ameaças a quem o desafiasse: “Pode haver algumas cabeças, inclusive de gente importante, que correm o risco de cair ! “.

Balestre, simplesmente urdiu tudo”, diria Max Mosley sobre o episódio e, alguns anos depois, possivelmente para aliviar o peso da sua consciência, Balestre admitiria haver “ajudado um pouco” a Prost, para que este conquistasse o titulo aquela temporada. Assim, e sem nada mais que poder fazer a respeito daquele incidente, a impressão geral era que a Senna se lhe havia privado de um titulo que tinha ao alcance da mão, enquanto que a Prost se lhe havia entregado um titulo que já se havia escapado da sua. Prost, ademais, continuaria com sua campanha anti Senna na imprensa chegando a dizer que o brasileiro era “um vírus maligno”.

Prost abandona a McLaren no fim do ano a McLaren e se incorpora à Ferrari para temporada de 1990, quando a equipe do cavalinho resurgia, enquanto que a britânica já mostrava sinais de esgotamento. Deste modo e uma vez mais, Senna e Prost protagonizariam outra acirrada disputa pelo titulo, como logo se viu com a vitória de Senna nos EE.UU e a de Prost na continuação no Brasil. Com a disputa do British GP chegaríamos à metade do campeonato, com Prost conseguindo sua quarta vitória até então, por três de Senna, e comandando a classificação com 41 pontos por 39 do brasileiro.

Nessa altura da temporada Prost e Mansell já estavam inimizados na Ferrari, pois o francês continuava com as suas habituais artimanhas e intrigas. Segundo o inglês contou, Prost não hesitou em recorrer às suas influencias para convencer o chefe da equipe e os diretores da Fiat para que lhe dessem tratamento preferencial se queriam ganhar o campeonato. O francês até lhes insinuou que era melhor se “livrar” do inglês, mas a gota que transbordou o copo veio precisamente naquele GP da Inglaterra.

Silverstone era um circuito onde Mansell se dava muito bem e, apesar do handicap do seu maior peso corporal, Nigel consegue a pole com quase um segundo de vantagem sobre o francês, ficando este em quinto lugar no grid. No entanto, ao ver o bom rendimento do companheiro, Prost pediria que seu carro fosse trocado pelo de Nigel para a corrida… Sem conhecimento do britânico.

Na corrida, Mansell percebeu que o carro não era o mesmo do dia anterior, mas só soube da troca depois por meio de um jornalista. Prost venceria e Mansell teria de abandonar, com a famosa imagem do britânico lançando as suas luvas ao público, pois cheio das politicagens de Prost, pensava se retirar da competição.

Nessa altura a Fórmula 1 estava tomada por esse ambiente de politicagem nos bastidores, na próxima coluna vamos concluir essa saga

Até lá

Manuel Blanco

Manuel Blanco
Manuel Blanco
Desenhista/Projetista, acompanha a formula 1 desde os tempos de Fittipaldi É um saudoso da categoria em seus anos 70 e 80. Atualmente mora em Valência (ESP)

4 Comments

  1. […] A palmada que não veio -Parte 3 […]

  2. Manuel Blanco disse:

    Oi caro Euardo,

    O que houvesse entre Prost e Senna era coisa deles. O realmente inaceitável foi a conduta de Balestre, tomando partido por Prost desde o principio.
    Supostamente, a FIA é a que deve velar pela esportividade, estando atenta a qualquer ação que atente contra a boa imagem da categoria, mas neste caso isso não foi assim e, como uma bola de neve rolando colina abaixo, a rivalidade foi adquirindo umas proporções que Balestre não soube controlar, ou não quis. Prost e Senna foram os protagonistas dessa rivalidade, mas o único responsável pelas suas consequências para a credibilidade da categoria foi Balestre com sua parcialidade.

    Abs. Manuel

    • Fernando Marques disse:

      Manuel,

      Entendo e concordo em relação ao ballestre.
      Mas penso que Senna não precisava dar o troco na mesma moeda em Suzuka 90.
      E não muito tempo depois vimos Schumacher fazer a mesma coisa . Sem nenhuma punição. Daí os precedentes.

      Mas não resta dúvidas sobre a parcialidade do Ballestre.

      Fernando Marques

  3. Fernando Marques disse:

    Manuel Blanco,

    O que a fórmula 1 assistiu em 1989 e 1990 a meu ver abriu precedentes negativos a imagem e para com a esportividade da categoria. Os dois foram anti esportivos .

    Show de bola pela parte 3

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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